O caos e o caso
"UNIVERSIDADE" É COISA DE RESPEITO, que dá a mão a beijar. Mas esta é gente que, do alto dos seus nós de gravata, se acusa das piores malfeitorias, com a desenvoltura que só vemos nas reportagens sobre bairros problemáticos. No cenário de um edifício com rendas em atraso, alguém que se diz reitor e outrem que se diz vice-reitor travam-se de razões sobre exércitos privados e "raides" de boinas-verdes; assembleias gerais em que reciprocamente se invectivam os representantes de um capital social que parece ultrapassar os 100%; despachos justiceiros e expeditos, demitindo e expulsando a contraparte; e um accionista que diz ser o dono porque os angolanos só confiam no sogro dele. Depois há acções judiciais, chamadas à Judiciária e prisões preventivas. E tudo isto numa linguagem prática, desassombrada e directa, mais ao jeito de Mickey Spillane do que do príncipe Salinas.
Nas vésperas de Mariano Gago anunciar a sua decisão, ainda há chuvas ácidas de nomes: são os novos intervenientes. Ora filhos dos outros, ora carreiras feitas na casa. Nomes que nada dizem senão talvez aos nomes que substituíram. E para que o que é pareça que não é, ainda se anunciam dois com reputação própria: Carvalho Rodrigues e Rodrigo Santiago. A ideia é que basta preencher um organograma para poder proclamar a "normalidade pedagógica" e resistir aos aliciamentos de uma concorrência rapace que convive bem com a selva em que eles escolheram viver.
Finalmente, o ministro anuncia o seu inevitável despacho provisório de encerramento, sem que ninguém - partidos, media, universidades - o conteste. O próprio Rodrigo Santiago classifica a decisão de "aceitável". Mas o novo presidente da Sides, enquanto circulam uns abaixo-assinados inanes e só para confundir, declara que tudo está normalizado e que, se "amanhã" não estiver, tal se deve apenas ao despacho do ministro. É visível a nova preocupação do empresário: fugir à responsabilidade civil perante os lesados, entre os quais avultam os estudantes (que, com alguma inocência, subscrevem a tese desta "normalidade", que não joga a seu favor na eventual reclamação dos seus direitos em juízo).
O que agora importa, no entanto, é que Mariano Gago esteja disponível para resolver o que nenhum poder até agora quis ou soube resolver e que o cidadão comum espera ver resolvido. Há este caso da Independente - o terceiro, depois da Livre e da Moderna - em que importa minorar, na medida do possível, a situação e o futuro dos estudantes. Mas há muito mais. Há que tentar remediar os resultados da incúria de sucessivas políticas - porque o alheamento e a omissão também fazem políticas - para com o ensino superior privado. O trigo aqui, o joio ali. Com uma regulação assumida, uma fiscalização eficaz e avaliações credíveis. Como ao Estado cumpre. E criando novos instrumentos de prestação pública de contas. Porque doravante os cidadãos vão querer saber quais são as universidades e quais são as vendas de enchidos de pronto-a-exercer. E até, mais prosaicamente, quais as que têm o ensino como vocação e actividade principal.
Foi isto que o caso da Independente veio recolocar. O resto - se Sócrates fez bem em lá ter aprendido ou se Marques Mendes fez melhor em lá ter ensinado - é angústia a que o país sobrevive. Por muito que se preze este duelo de honra entre acusadores e acusado, este exercício de caça à raposa com trompas de Santo Humberto, não pode esquecer-se que, ao Parlamento, ninguém chamou ninguém. Era menos arriscado deixar isso por conta de investigações jornalísticas, mais férteis em perguntas do que capazes de respostas. Agora, após a intervenção dos partidos que confiam ter a ganhar com a prática de uma oposição em cruzeiro (BE e PCP), arrastar as coisas já implicava dar a cara. E o líder do PSD teve de assumir o odioso a que tinha querido escapar. Ao ponto de arriscar que se possa ver uma falha de carácter no facto de ele acusar disso alguém, mesmo antes de concluído o inquérito que julgou necessário reclamar.
«DN» de 15 Abr 07Etiquetas: NBS
2 Comments:
A ideia com que se fica é que todos os partidos têm, em relação à UNI, "rabos de palha".
Ed
http://www.tsf.pt/online/portugal/interior.asp?id_artigo=TSF179480 :
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A Universidade Independente anunciou, este domingo, que vai apurar responsabilidades quanto à existência de vários certificados passados a José Sócrates por esta instituição, dado que «alguns poderão ser forjados».
Esta nota emitida pelo gabinete de imprensa desta universidade surge um dia depois de o site do jornal «Público» ter divulgado a existência de um certificado, datado de Agosto de 1996 e que inclui um número de telefone que só poderia ser posterior a 1999.
Para além de existir esta incongruência com o número de telefone da universidade, também consta neste documento, assinado por Luís Arouca, na qualidade de reitor, um código postal, também da universidade, com número que só existiu após 1998.
Fonte do gabinete do primeiro-ministro explicou à agência Lusa que o certificado em causa foi solicitado por José Sócrates em 2000 e enviado para a câmara da Covilhã, onde o actual chefe de Governo foi funcionário, no mesmo ano, tendo este gabinete remetido para a universidade explicações sobre estas incongruências.
Também em declarações à agência Lusa, o presidente da câmara da Covilhã explicou que a autarquia recebeu um certificado de habilitações em Setembro de 2000, que «tinha um erro, tinha menos um algarismo no ano», constando como data de conclusão do curso «08/08/9».
Perante esta situação, Carlos Pinto diz ter pedido a José Sócrates que enviasse um novo certificado com os números todos, algo que aconteceu «no espaço de dias», ainda em Setembro desse ano.
Segundo o autarca, a câmara recebeu os dados correctos de José Sócrates num papel timbrado da universidade, com a morada, código postal e números de telefone actualizados da Universidade Independente.
Carlos Pinto atribuiu algum eventual erro à própria universidade, considerando que o «comportamento de José Sócrates para com a câmara foi irrespreensível».
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