19.4.07

O ex futuro talvez engenheiro

“É entrar senhoras e senhores! Temos declarações bombásticas! " - diziam com sorrisos prometendo escândalo.
*
Pensámos todos que, além do Sr. Primeiro - mais conhecido por futuro-ex-talvez-engenheiro - mais de metade da população portuguesa de políticos colocados ou por colocar na praça, não tinha habilitações legais! Era-nos quase garantido que exibiam diplomas de tal modo forjados e inconsequentes, que não passariam à lupa gordurosa do mais desatento investigador da judiciária do Burkina Fasso. Tudo a pratos limpos, daqui a nada às 20.00, em directo. Caramba!
Mas afinal não. Depois de um adiamento suspeitíssimo, vem a esponja desculpabilizadora, na pessoa de uma criatura balbuciante e trapalhona, um pseudo alto responsável, figura afinal sem dotes, nem para explicar porque é que o autocarro se atrasou na paragem do meu bairro. Um rosto de dignidades perdidas e sem nome, um mais que evidente permutar de mão, um estilo deixem-nos viver que nós também. Um baralhamento total, uma incapacidade explicativa, uma impreparação arrepiante, uma oral ao nível da outra – a tal de que ninguém sabe a pauta, nem onde se realizou, e, se existiu, foi decerto em casa do Reitor, em amena cavaqueira, entre dois gins. O país de opereta Buffa, no seu melhor pior…
Mas vejamos.
Os exames agora são ao domingo em casa do Reitor, acompanhados de um bilhetinho a relembrar que “olhe que sou eu, o tal fulano importante, veja lá se percebeu”!? E considera-se automaticamente aprovado? Agora é assim?!
Um bacharelato no meu tempo só dava acesso a Licenciatura com mais dois anos de estudos. Mas será que agora com cinco-cadeiras-cinco e um só Professor tudo se resolve?! Ah! Mais um papelinho feito em casa, tipo “veja lá duas paginazinhas chega?” enviado por correio? Isto agora é assim?
Fazem-se sem cuidado nem pudor biografias oficiais com currículos apócrifos - ou antecipados, já nem sei…- tal é a baralhada? Agora é assim?!
O referido professor foi em seguida repetidamente nomeado para cargos de governo e ninguém sabia de nada? Como?
A pauta de um exame pode não ter nota final, nem data da sua realização? Não há actas de exame de nada?! Agora é assim?!
Esclareçam-me, por favor. Isto deve andar tudo muito mudado! Apesar de tudo, ainda fui professor 23 anos, sei do que falo.
O que nos dizem e informam, arrepia-me. Arrepia qualquer pessoa que saiba minimamente o que é tirar um Curso superior e ter uma carreira académica séria.
“Nós prometemos revelações escandalosas”, diziam eles.
Mas isso era antes do circo da mentira descer à cidade.
O que apareceu foi nebuloso, ridículo, a chamar-nos a todos atrasados mentais. Nunca ninguém tinha visto uma conferência de imprensa assim, tão sem verdade, nem jeito, nem tão mal disfarçada. A coisa estava pessimamente aprendida. A conferência de imprensa afinal, era um apressado elogio pegado e sem nexo, de tipo bajulador e untuoso ao Sr. Primeiro, sempre argumentando que não havia meios de ninguém poder saber nada.
Quando nada se sabe, nem se vai ser capaz de nada acrescentar, não se dão conferências de imprensa.
O pobre quadro executivo, que de lente pouco teria, só pode ser excessivamente pago, para tão fraca substância retórica, tão pouca convicção, tão nítida atrapalhação. O Sr. Ermelindo da pastelaria, que é gago de nascença, não faria pior. Confuso, a nada satisfez. Nem discurso, nem talento, que é uma coisa que faz imensa falta, até para mentir.
A montanha, afinal, paria um rato. Um ratinho de peluche. Manso.
Não basta dizer à exaustão que “isso não sabemos, esses elementos não podemos dispor”. Isso é impensável.
Se essa Universidade é competente, então tem de ter os meios para provar os exames que faz, as pautas respectivas, o mapa de frequências, as notas que foram dadas, as datas respectivas, as actas, etc.
Não façam de todos nós imbecis que nada percebemos.
Não me custa ser governado por um promitente ex-futuro agente técnico adaptado. Podia até ser torneiro mecânico. Foi eleito e tem maioria. O Presidente do Brasil tem, ao que creio, instrução primária e pouco mais. Foi eleito; ganhou. O mesmo neste caso aqui se pode argumentar. É Primeiro por mérito próprio e voto na urna.
Mas é feio descobrir que as coisas funcionam assim. É imensamente feio. Para todos os pais que lutam com esforço para pagar estudos, roubando ao orçamento familiar, em endividamentos que roubam pão à sua mesa e horas ao seu sono.
Porque andar na faculdade custa tempo, dinheiro e estudo a todas as pessoas normais. Como então perceber favorecimentos às que menos precisam de favores? Aos eleitos da Nação!
O nosso futuro-ex-afinal-talvez-engenheiro clamou ainda - na sua bem encenada entrevista - inocência e falta de lóbis, porque na altura era apenas um “pobre deputado da oposição"!!!
Olhe, Sr. Ex-futuro-afinal-talvez: - eu nunca fui sequer deputado. Logo, tive de fazer o antigo sétimo ano, admissão à faculdade, mais cinco aninhos a marrar, ir às aulas, fazer estágio de um ano, defender Relatório final de curso e tese original. A minha tinha 247 páginas, por acaso ainda me lembro. Para não falar em estudos posteriores, que já foram a meu gosto, escolha minha, não quero, pois, cansá-lo. Uma vida.
Ninguém me deu equivalências fáceis. Nunca ninguém me juntou nenhum bacharelato com mais cinco cadeiras e me ofereceu uma Licenciatura de bónus. Nunca adicionei nenhum bilhetinho de Secretário de Estado a qualquer exame, nem me fizeram exames de favor, pelo correio. Tive de assistir às aulas, tive de fazer provas escritas, orais e práticas. Custou-me tudo isso tempo, estudo, saber, esforço e muito dinheiro. Já era casado. Já era pai, sabe? Tinha por vezes noites perdidas; trabalhava de tarde e de noite; e, quantas vezes, ia para as aulas com sono, esgotado, quase a cair. Mas ia. Tinha de ser.
E esta é apenas uma história entre milhões. Porém, ao que parece, não é assim para todos. E isso é feio. Muito feio.
Mas hoje, se faz favor, Exmo. Senhor (ex futuro afinal parece que talvez nunca se sabe), quando me vir, trate-me por Professor. Posso não ter ar disso, mas sou. Isso sei que sou. Tenha respeito.
E outra coisinha: - por favor nunca assine projectos de pontes. Nunca faça estradas, viadutos ou simples telheiros no quintal. Podiam cair.
Tem acontecido demais por cá.
Se calhar, se fôssemos bem a saber, percebia-se porquê…
PB, licenciado

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17 Comments:

Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

No meio de tanta trapalhada, uma das poucas coisas sobre as quais já não restam dúvidas é que José Sócrates não tem direito ao título de «Engenheiro». Goste-se ou não desse facto, pense-se o que se pensar, é isso que sucede.

No entanto, Lúcio Pimentel (na conferência de imprensa), Duarte Lima (na SIC-N das 21h) e Jorge Coelho (n' «A Quadratura do Círculo») continuam a referir-se (e muito insistentemente - como que sublinhando) a José Sócrates como Engº Sócrates.

Em termos de rigor estamos, pois, conversados...

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De notar, também, a posição de Odete Santos (desvalorizando todo o assunto).

Salvaram-se as duas perguntas finais de Mário Crespo que entalaram os dois entrevistados.

19 de abril de 2007 às 09:13  
Anonymous Anónimo said...

Falta esclarecer quais foram essas perguntas finais do M. Crespo.

Perguntou-lhes o que achavam da biografia oficial (falseada e depois emendada à pressa) no «Portal do Governo» e nos documentos da A.R.

Duarte Lima e Odete Santos engasgaram-se e não responderam.

M. Crespo sorriu e deu a entrevista por encerrada...

Ed

19 de abril de 2007 às 09:30  
Anonymous Anónimo said...

"Tive de assistir às aulas, tive de fazer provas escritas, orais e práticas. Custou-me tudo isso tempo, estudo, saber, esforço e muito dinheiro. Já era casado, sabe? Tinha por vezes noites perdidas; trabalhava de tarde e de noite; e, quantas vezes, ia para as aulas com sono, esgotado, quase a cair. Mas ia. Tinha de ser."
Revi-me inteiramente nestas palavras. Depois de ter tirado um bacharelato, resolvi tirar uma licenciatura, foram dois anos de muito sacrificio, o cansaço por vezes era tanto que, cheguei a lavar os dentes com creme da barba e só dar por isso no fim.
Dez anos mais tarde, voltei a frequentar o ensino superior para conseguir outra licenciatura, apesar de já ser licenciado e de esta licenciatura ser da mesma área da anterior, tive de fazer mais nove cadeiras cadeiras. É escusado dizer que todo este percurso foi feito no ensino público.
Apesar da má imagem que tinha do ensino superior (e não só) privado, fiquei de queixo caído, quando ouvi falar de trabalhos de duas páginas no ensino superior. O meu filho mais novo, que frequenta o 5º ano ano do ensino básico, entrega trabalhos de mais de 20 páginas.
No meio de tudo isto, não culpo Sócrates, ele apenas seguiu um percurso parecido com o de milhares de alunos que não tinham notas para entrar no público, mas que depois concluíram cursos no privado com médias superiores áqueles que se sacrificaram no ensino público.

19 de abril de 2007 às 09:41  
Anonymous Anónimo said...

Excelente texto.
Concordo com tudo.
Abraço

19 de abril de 2007 às 10:52  
Anonymous Anónimo said...

Parabéns,

Foi das análises mais lúcidas que li nos últimos tempos, e uma "brisa fresca" na actual trapalhada em que se converteram os comentários na blogosfera.

Também fui trabalhadora-estudante nos últimos três anos da minha licenciatura, quando decidi retomar o curso que entretanto interrompera. Casada, com 3 filhos, sendo que o mais pequeno tinha 6 meses. Foi um sacrifício imenso, e anos em que práticamente não fui á cama...enfim,

Talvez por isso tenha ficado tão "afectada" com a presente situação.

Espero, ardentemente, que a verdade seja apurada e os responsáveis punidos. Como? Não o sei!

Mas a Lei aplica-se a Todos, sem os distinguir, e eu ainda acredito nisso!

Um abraço

19 de abril de 2007 às 12:09  
Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

Em relação a toda esta embrulhada (do tipo «Cada cavadela, sua minhoca»), também compreendo os que assumem uma postura cínica e que desabafam:

«Que diabo! Tendo em conta que está em causa alguém que chegou a primeiro-ministro cavalgando uma grande mentira (a rábula os impostos), de que é que estavam à espera?!».

E, na verdade, o que não faltam por aí são ditados populares a dar-lhes razão...

19 de abril de 2007 às 12:29  
Anonymous Anónimo said...

Este caso é muito triste. Ontem queriam que o caso ficasse encerrado.. para mim nunca

19 de abril de 2007 às 14:54  
Anonymous Anónimo said...

"Alguns professores facultavam os exames antecipadamente a alunos, de modo a favorecerem a sua prestação académica. Estas situações terão ocorrido entre 1998 e 2003, tendo afectado centenas de alunos que frequentaram a Universidade Independente." - Correio da Manhã.Só isto devia bastar para o encerramento desta "universidade".
Felizmente que era só neste estabelecimento de ensino e que tal não se verifica também no ensino secundário. Os alunos do ensino secundário na minha Santa Terrinha que, podendo ter o ensino gratuito à porta de casa, migram para escolas particulares de Lisboa, apenas o fazem porque nestas escolas os professores sabem ensinar melhor.

19 de abril de 2007 às 15:43  
Anonymous Anónimo said...

Anónimo da 3:43 PM

Mas então não foi isso que sucedeu com a prova de Inglês Técnico de J.S.?

Esqueçamos a data que lá vem (22 Ago 96, que choca com a de 8 Ago 96 que ele indica como data de licenciatura).

Esqueçamos a fraca qualidade da prova.

Esqueçamos o cartãozinho da S.E. Ambiente.

Esqueçamos isso tudo, e interroguemo-nos apenas sobre uma coisa:

Então uma prova de exame... foi FEITA EM CASA?!

19 de abril de 2007 às 16:01  
Anonymous Anónimo said...

Quem fica também MUITO MAL no meio disto tudo (e não só por causa do Chefe del) é Mariano Gago, que tenho como pessoa séria.

Ed

19 de abril de 2007 às 16:03  
Anonymous Anónimo said...

Mais um prof lixado com o nosso Primeiro.
Nós percebemos ...

19 de abril de 2007 às 16:44  
Anonymous Anónimo said...

Excelente texto de Pedro Barroso.

Tal como ao leitor Manuel Alentejano, também me sensibilizou particularmente a referência ao esforço feito para tirar o curso.

Claro que ninguém tem culpa de eu ter casado aos 20 anos. Nesse aspecto até foi bom, pelo facto de ter deixado uma vida de paródia que me fez perder dois anos de estudos. Mas a verdade é que tive de dar o litro para acabar o curso de engenharia electrotécnica, numa escola credível, como era (e julgo que ainda é) o Instituto Superior Técnico, o "velho" IST.

Tinha de ir às aulas e tinha de dar explicações em casa para ajudar ao sustento da família, entretanto aumentada com duas inevitáveis criancinhas. E no meu último ano (ao tempo eram seis), convidado para monitor de uma turma do 3º ano, tinha de acumular o estudo das minhas cadeiras com a preparação das aulas aos meus alunos no dia seguinte.

É natural que olhe com um certo desprezo para um tipo como Sócrates (e não só, pois o amigo dele, o tal Vara da CGD não escapa à mesma suspeita) quando penso que, com toda a probabilidade, arranjou uma licenciatura de forma fraudulenta, sem pôr os pés na escola, com exames fictícios, conhecidos antecipadamente e até feitos em casa...

Um tipo destes é um aldrabão compulsivo. Tudo aquilo a que estamos a assistir é miserável. Incluindo a intervenção do ministro Mariano Gago, meu colega de curso. Bem sei que ele andava enganado no curso. Não tinha vocação para engenharia, mas sim para Física teórica. Em todo o caso, pensei que fosse mais perspicaz e tivesse percebido de imediato aquilo que meio Portugal, mesmo pouco letrado, já percebeu.

Jorge Oliveira

20 de abril de 2007 às 06:39  
Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

Pois...

Também eu tive de fazer 6 anos no IST (acabados em 1970) + 2 meses de Estágio em Portugal (no Arsenal do Alfeite) e + 1 mês no estrangeiro (numa Central Eléctrica)+ 3 Relatórios de Estágio (que tiveram de ser aprovados), etc.

Quando os 6 anos passaram a 5 e os estágios deixaram de ser obrigatórios, lamentei o que me parecia uma diminuição de exigência.
Mal sabia eu que era possível ela descer mais - MUITO MAIS! - com o "amen" (ou por iniciativa!) de quem mandava no País e na Educação.

Fico triste, também, pelo papel que o Mariano Gago está a (ser obrigado a) desempenhar, defendendo uma palhaçada - tanto mais que, tendo-se formado em 1971 (segundo julgo) foi sujeito a um curso de engenharia de grande exigência.

20 de abril de 2007 às 08:53  
Anonymous Anónimo said...

Estás certo, Medina.
Se eu não tivesse andado na borga nos dois primeiros anos do IST, teria acabado em 1969. Foi assim que o Gago teve a subida honra de fazer parte do meu curso, que acabou em 1971. O tal curso que, após uma reforma dita "reaccionária", ficou conhecido como o dos 5 anos e meio (embora o "meio" tivesse esticado até ao fim de Maio...)
JO

20 de abril de 2007 às 12:11  
Anonymous Anónimo said...

Também frenquentei o IST tendo entrado em 1969 e lá conheci o Mariano Gago. Não terminei o curso e hoje sendo um administrativo da FP, mal pago e perseguido pelo Sócrates reparo que tenho mais cadeiras do que o pretenso sr. Engº, entre elas as famosas Matemáticas Gerais. Suávamos muito para conseguir fazer cadeiras de grande complexidade e exigência e ainda nos sobrava tempo para contestar, lutar e preparar o terreno para a liberdade que se aproximava.

21 de abril de 2007 às 13:55  
Blogger Fernando Martins said...

Este comentário foi removido pelo autor.

21 de abril de 2007 às 18:49  
Blogger Fernando Martins said...

Pois eu, licenciado em Geologia pela Universidade Coimbra, tive de trabalhar no duro para acabar o curso (com média de quinze, bem suados...) e custa-me ver um aldrabãozeco fazer uma carreira com tantas mentiras, patranhas, omissões e favores.

E não me venham dizer que o Ensino Superior Privado é todo igual - tive a honra de dar, durante 6 anos, aulas no ISLA de Leiria (fazendo parte, como representante dos professores licenciados, do seu Conselho Científico) e nunca vi nada parecido com o que nosso Primeiro Mentiroso (perdão, queria dizer Primeiro Ministro...) disse que foi a "carreira académica". No ISLA de Leiria as equivalências só se davam se TUDO o que estava numa cadeira obrigatória do curso estivesse na cadeira feita fora da Escola (até porque de outra maneira o Instituto ficava prejudicado...). E neste Instituto havia pautas oficiais, com assinatura do docente e registo de termos (assinados sempre por mais de um docente). Havia orais pública, coadjuvadas, em que na dúvida se chumbava o aluno. Em súmula, havia decência...

E é por isto tudo que, se o senhor Sócrates tem um pingo de decência, deve demitir-se quanto antes - se gosta de vergonhas, fique com elas para si e não nos obrigue colectivamente a passar pelas mesmas. Um país como o nosso merece mais e melhor do que um grande mentiroso como PM...

21 de abril de 2007 às 18:51  

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