DUAS MANEIRAS DE FALAR DA CONSTITUIÇÃO
Por Pedro Lomba
NÃO SEI BEM quantos portugueses conhecem a nossa Constituição ou que ideias têm. Se em 2007 fizéssemos um inquérito para testar o "sentimento" constitucional do País, a que resultados chegaríamos? Imagino, para começar, que uma maioria silenciosa responderia "não sei" e sem se incomodar muito por isso. Outros talvez dissessem que a Constituição foi aprovada em 1976 e revista depois umas quantas vezes. Outros de certeza que associariam a Constituição ao 25 de Abril. Outros falariam do seu conteúdo: a lei fundamental do Reino, a lei que define os nossos direitos básicos. No fim, iríamos provavelmente concluir que o grosso dos portugueses é sobretudo indiferente à Constituição. Nem orgulhosos, nem críticos: só indiferentes.
Admito, por isso, que muita gente tenha ficado alarmada com o discurso final de Luís Filipe Menezes no último Congresso do PSD. Indiferentes à Constituição? Como? Segundo o edil de Gaia, Portugal tem um problema. Melhor: Portugal tem dois problemas. O primeiro é a Constituição caduca que temos e o líder do PSD avisou que irá mandatar o grupo parlamentar do PSD para fazer uma nova. O segundo é o Tribunal Constitucional e Menezes quer o controlo da constitucionalidade nas mãos do Supremo Tribunal de Justiça. Devo dizer que não se percebe este ataque de Menezes ao Tribunal Constitucional, um órgão que existe em quase todos os países da Europa e com o qual não nos temos dado mal por cá. É um disparate achar que o Tribunal Constitucional tem actuado estrategicamente contra os políticos e contra certas políticas. Há certamente muita coisa a debater ou a alterar (para aqueles que trabalham na área, não acham o valor das custas no Tribunal Constitucional uma exorbitância?). Infelizmente, estudamos e discutimos pouco.
O apelo de Menezes à transição constitucional é mais complicado. A verdade é que o recém-eleito líder do PSD escolheu o pior caminho: responsabilizou a Constituição pela estagnação e ingovernabilidade do País. Trata-se de outra falácia, esta de pensar que os nossos problemas residem na Constituição. Não que a Constituição seja insusceptível de críticas sérias. A glorificação da Constituição de 1976 padece dos mesmos defeitos que o seu ataque destemperado. E renovar alguns dos nossos pretensos consensos constitucionais não seria necessariamente um erro. Em 2000 a Finlândia aprovou uma nova Constituição: um dia também nós faremos o mesmo. Mas uma coisa é um discurso crítico e informado da actual Constituição que tenha os pés bem assentes na terra; outra é provocar uma querela constitucional em Portugal, imputando à Constituição uma função e uma responsabilidade que continuam a caber aos políticos. Menezes falou mas não percebeu a diferença.
«DN» de 18 de Outubro de 2007 - c.a.a.
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1 Comments:
De facto (e como dizia Bordalo no magnífico desenho que se vê no "post" anterior), o Zé quer lá saber da Constituição!
Quer é tocar gaita e, pelo caminho, nem se rala que lhe vão aos bolsos (vazios, aliás...), enquanto os políticos "vendem o peixe" deles.
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