Afinal, nem tudo é asno
Por Ferreira Fernandes
ONTEM a SIC mostrou-nos o Centro de Acolhimento de Burros em terras de
Miranda do Douro. Os burros, vivendo 35 anos, a dada altura ficam velhos
para o mercado de trabalho. Para explicar a um burro imprestável, cujos
olhos pestanudos mostram não entender nada do que lhe sucede, havia que
lhe lançar a fórmula moderna: "Qual é a parte de 'não há dinheiro para
ti' que não entendes?" Mas os burros são burros e os seus donos
geralmente não têm licenciatura em Comunicação Empresarial. Acresce que
muitos dos donos dos burros velhos já estão tão velhos quanto eles, se é
que também não tão burros, e não procuram obter com os quadrúpedes o
derradeiro lucro. Na verdade, há um mercado para a compra da carne velha
de burro, para ser deitada às matilhas de cães. Mas não, aos burros,
falo agora dos bípedes, custa-lhes o desprezo pelos últimos dias do seu
burro. Então, sem ligarem ao provérbio da Escola de Chicago "a mula com
mataduras (mazelas) nem cevada nem ferraduras" - isto é, nada de gastar
em reformas -, os donos vão levar o burro ao Centro de Acolhimento, em
Duas Igrejas, para descansados últimos dias. Ali, recolhem-se burros
velhos, limam os dentes pontiagudos, cuidam dos cascos e deixam-nos
passear sem precisar de arrastar o arado. Embora me pareça desperdício a
manicura para improdutivos, confesso que a dado passo da reportagem me
comoveu a visita semanal de um casal de jarretas ao seu velho
companheiro.
«DN» de 24 Fev 13 Etiquetas: autor convidado, F.F
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