ÁGUA DE COCO - Glorioso Santo
Por Antunes Ferreira
EM GOA não há católicos não praticantes. Aqui o catolicismo é “radical”:
ou se é católico de missa dominical ou mesmo quotidiana, ou não se é. Não há
meios-termos como no maniqueísmo entre o branco e o preto: o cinzento, seja
mais carregado ou menos não existe. E nas missas (quase) toda a gente comunga.
Naturalmente não me refiro aos hindus, uma maioria destacada. De resto os
católicos – embora firmes - são cada vez menos: nem 30% chegam a ser. A zona de
Salcete, de onde a Raquel é natural, é onde os católicos predominam – ainda.
Como me disse o padre Mouzinho daqui a pouco só restarão as igrejas…
Que aqui não faltam: catedrais, igrejas, capelas, nichos votivos,
cruzeiros e similares. Quando se vai de Pangim a Margão (a segunda cidade) são
tantos que já deixei de os contar. Porém a maior parte do estado é hinduísta. O
hinduísmo não é uma religião, é uma forma de vida; nele existem templos
diversos dedicados aos deuses que são em número para dar e vender… Só para dar
um exemplo, quando há anos fui de Bengalore a Misore, pelo caminho encontrei
uma multidão com serpentes vivas nas mãos. Iam ao templo da deusa da serpente
cujo nome não retive.
Em Goa os templos católicos convivem com os hindus e as mesquitas e as
sinagogas. Ainda que os muçulmanos não sejam do agrado dos outros. O Francis,
chofer de táxi, disse-me que um dia destes Goa passará a chamar-se Burquistão.
De burca, naturalmente… Aliás para ele e para mais gente o tempo dos
Portugueses é que era porreiro… Os muslimes invadiram a terra, ou vão-no
fazendo e já são em número considerável. São facilmente reconhecidos, eles de
barbas grandes, elas vestidas normalmente de negro e somente com os olhos numa
fresta que não deixa ver mais nada do que eles. O Aycha condutor de riquexó
informou-me que até nesse meio de transporte muito utilizado e barato eles
estão a tirar o lugar aos goeses e já dominam o mecado, de Meca, obviamente. O
mecado e o mercado.
Porém volte-se ao catolicismo. Há igrejas, capelas e até a Sé Catedral em Velha Goa esgotam os
nomes sagrados, desde o Coração de Jesus até à Santíssima Trindade, passando
por Santa Inês, São Pedro, São Paulo, Nossa de Fátima, diversas outras Nossa
Senhoras, Sagrada Família, naturalmente São Francisco Xavier que continua a
reinar sem contestação alguma. Tudo indica que mais dia, menos dia, haverá um
templo com o nome do Santo padre José Vaz, recentemente canonizado. Curioso.
Mas para além do apóstolo das Índias quem pontifica é o São Sebastião que se
afigura ter caído na graça dos católicos goeses. Ele é a igreja, ele é a
capela, ele é omnipresente. Nas Fontainhas (a “Alfama” de Pangim onde reina a
arquitectura portuguesa antiga) há uma capela dedicada ao Santo junto da qual
está a casa onde morou a Raquel.
Já estava convencido da importância do santo carregado de flechas
(enterradas no tronco nu dele) mas acabo de confirmar o que pensava. Vindo de
Vernã para Pangim no táxi do já citado Francis passei por mais uma capela. O
que não é motivo de espanto…, bem pelo contrário. Como atrás referi elas são
como os cogumelos, salvo seja, só que não são de geração espontânea. Quem as
edificou foram os nossos antepassados. E nada de enganos. Homens são homens,
esporos são… esporos. Já vejo no horizonte o Vaticano agitar-se e brandir a
excomunhão; porém Roma não se safa, já plantei o salvo seja que espero como
boia de salvação ou bula redentora d Mas
desta feita o templo tem o nome bem destacado na frontaria: Chapel of the Glorious Saint Sebastian.
Para que não haja dúvidas ou maledicências que há por este Mundo fora, o
letreiro acaba com elas. Ou seja neste caso o santo é reconhecidamente
glorioso.
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