OS OBREIROS DA GEOLOGIA PORTUGUESA (3)
Por A. M. Galopim de Carvalho
Carlos Ribeiro (1813-1882)
Pioneiro da geologia portuguesa, iniciou estes
estudos a meados do século XIX, pondo especial ênfase no trabalho de campo,
inovando uma prática quase inexistente no panorama científico da geologia
portuguesa. Foi o primeiro geólogo português que, no quadro dos conhecimentos
da época, estabeleceu a sucessão estratigráfica dos terrenos de Portugal
continental, podendo ser considerado o
fundador da estratigrafia portuguesa.
Nascido de uma família de poucos recursos,
conseguiu, com muito empenho e com o apoio de amigos, finalizar os estudos que
o habilitaram a ingressar no ensino superior. As lutas liberais arrastaram-no
para o serviço militar e, terminados os conflitos, em 1834, retomou os estudos
na Academia Real de Marinha e, depois, na Escola do Exército, concluindo, em
1837, os cursos de artilharia e engenharia com distinção, na qualidade de
oficial.
Em 1840, estando em serviço no Porto, no 3º
Regimento de Artilharia, deu seguimento à sua vocação para uma carreira
técnico/científica, frequentando, com notoriedade, o curso da Academia
Politécnica. Tendo começado a trabalhar na Companhia das Obras Públicas de
Portugal, foi encarregado de dirigir a construção da estrada de Lisboa às
Caldas da Rainha e da de Carvalhos a Ponte de Vouga, obras que lhe puseram à frente dos olhos a natureza dos terrenos
esventrados no traçado daquelas vias, intensificando grandemente o seu
interesse pela geologia.
Em 1849, aceitou trabalhar nas minas de carvão
do Cabo do Mondego e Buçaco, tendo estudado o terreno escolhido para o
cemitério de Coimbra.
Em 1852, Carlos Ribeiro foi convidado por
Fontes Pereira de Melo, para chefiar a 4ª secção da Repartição Técnica da
Direcção Geral de Obras Públicas, com o encargo de superintender a actividade
das minas e pedreiras e os trabalhos geológicos, em início de organização. Dois
anos depois, em conjunto com Francisco António Pereira da Costa (1809-1898)
lente da cadeira de Mineralogia e Geologia da Escola Politécnica de
Lisboa, elaborou a Lei de Minas. Nos
anos que se seguiram, assegurou a chefia dos trabalhos de geologia com as de
chefe da repartição de minas e pedreiras, e ainda as de vogal do Conselho de
Obras Públicas e Minas.
Em 1857, com o objectivo de elaboração do Mapa
Geológico de Portugal, Carlos Ribeiro fundou, de colaboração com o referido
lente Pereira da Costa, a atrás citada Comissão Geológica do Reino, incorporada
na Comissão dos Trabalhos Geodésicos, no quadro do Ministério das Obras
Públicas, sendo Carlos Ribeiro nomeado o seu director. Esse objectivo foi
concretizado de parceria com Nery Delgado
(1835-1908) e, assim, cerca de
duas décadas depois, surgia, em 1876, o
primeiro Mapa Geológico de Portugal, na escala de 1:500 000.
Tendo estabelecido relações com Daniel Sharpe,
permitiu-se corrigir algumas das observações deste conceituado geólogo amador,
o que lhe valeu reconhecimento internacional. No dizer de Paul Choffat: Carlos Ribeiro deve ser considerado como um discípulo de Sharpe,
porque foram as publicações do sábio inglês que serviram de base aos seus estudos, tendo
mantido com ele uma aturada correspondência; mas o discípulo foi rapidamente muito além do mestre, no conhecimento da geologia portuguesa.
Carlos Ribeiro viajou por diversos países da
Europa e manteve correspondência regular com os mais eminentes especialistas da
época. Na década de 1850, traçara o primeiro esboço de uma carta geológica da
região compreendida entre o Tejo e o Douro e um outro do Alentejo, duas
realizações que contribuíram para a elaboração do primeiro mapa geológico de
Portugal e que Eduard Verneuil e Eduard Collomb utilizaram na elaboração do
Mapa Geológico da Península Ibérica, na escala 1:1.000.000, editado em
1864.
Desenvolveu diversos estudos de geologia
mineira e de hidrogeologia, com destaque para o estudo do abastecimento de água
à cidade de Lisboa, e foi o grande
impulsionador dos estudos de arqueologia e pré-história em Portugal.
Atribui-se-lhe os achados das grutas do
Poço Velho (Cascais), das Antas do Monte Abraão (Belas) e do povoado de Leceia
(Oeiras) e deve-se-lhe a descoberta em,
1863, dos concheiros de Muge, designação que deu aos amontoados de conchas de
moluscos e outros restos de comida. Conservados junto desta povoação do vale do
Tejo, estes importantes testemunhos pré-históricos estão associados a
esqueletos humanos, a objectos talhados em pedra e em osso atribuídos ao
Mesolítico.
Carlos Ribeiro dedicou os últimos anos da sua vida em busca de vestígios
dos nossos antepassados nas formações miocénicas e pliocénicas da Bacia do
Tejo. Mercê de uma sua convicção
(errónea) sobre a existência de um hominídeo surgido nesses tempos, esteve no
centro da discussão que remetia para o Terciário os começos da nossa presença
na Terra. Por seu empenho e para debate desta questão, teve lugar em Lisboa, em
1880, o IX Congresso Internacional de Antropologia e Arqueologia
Pré-Históricas.
*
Francisco António Pereira Da Costa (1809-1898)
Bacharel em medicina, em 1833, pela Universidade de Coimbra, foi
nomeado, em 1840, lente da cadeira de Mineralogia e Geologia da Escola
Politécnica de Lisboa, cargo que exerceu até se reformar, em 1887. Além destas
matérias, dedicou-se ao estudo da paleontologia. e da arqueologia pré-histórica. Pioneiro nestas
disciplinas em Portugal, da sua obra destaca-se um estudo dos moluscos fósseis
do Terciário de Lisboa e do Algarve, com especial realce para a jazida de
Cacela, e um outro sobre paleontologia humana em terrenos do Vale do Tejo.
Classificou os materiais das colecções do Palácio Real da Ajuda,
existentes na Academia Real das Ciências, de que foi membro efectivo. Em 1853
foi eleito membro do Conselho de Minas e, em 1857, de parceria com Carlos Ribeiro, fundou a Comissão Geológica do Reino, assumindo o encargo dos estudos de paleontologia e
o da organização das colecções.
*
Louis Charles Gaston de Saporta (1823-1895)
Paleobotânico francês, membro da Academia das Ciências de
Paris, foi o autor do estudo das plantas fósseis recolhidas por Paul Choffat em
diversas formações do Mesozóico português e, assim, precisar a idade dos
respectivos terrenos. Deste estudo resultou a publicação, em 1894, de Flore fossile du Portugal - Nouvelles contributions a la
flore mesozoïque.
Do seu trabalho destaca-se a descoberta de espécies de
dicotiledóneas no Cretácico inferior de Cercal (Ourém), num nível muito mais antigo do que até então era conhecido, passando a localizar-se em Portugal o berço
deste grande grupo botânico
Etiquetas: GC
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home