20.10.17

LÍNGUA FRANCA

Por Joaquim Letria
Deixámos de andar e de correr para passarmos a fazer “footing” ou “jogging”. Abandonámos a vela e a prancha para praticarmos “sailing”,”surfing” e “windsurfing”. Deixámos de andar ao sabor da maré em cima duma prancha para passarmos a fazer “planting”. Reunimo-nos em “meetings”, discutimos os nossos problemas em “brainstormings”, avaliamos o nosso conhecimento em “tests” escritos e orais, depois de termos abandonado os pontos ou as chamadas. 
Nas empresas, onde já não há trabalhadores mas sim colaboradores, deixámos de despedir gente e cortar nos custos para passarmos a fazer o “downsizing”. Parámos de recorrer a serviços externos ou a parcerias para nos dedicarmos ao “outsourcing”, trocámos as diferenças de nível pelo "super – in” “benchmarking”.
Aquilo que eu tanto gostava de fazer em Los Roques, Venezuela, ou no Cayo Largo, Cuba, e que era respirar por um tubo e ver por uns óculos de mergulho, passando horas seguidas a dar às barbatanas, a ver ou a filmar peixes às cores, às riscas ou às bolinhas, passou a ser uma actividade que dá pelo nome de “snorkling”.
“Snorkling” não é para qualquer um! Encontrei numa estreia uma dessas divas das nossas revistas cor de rosa com um bronze invejável. Julguei que viesse do Brasil, ou de África, mas disse-me que não senhor. Tinha estado com o seu PT (o nosso antigo treinador ou instrutor agora promovido a “Personal Trainer”) no Mar Vermelho, o qual, segundo me confidenciou, para fazer “snorkllng” não era alucinante, era “mega-super-alucinante!!” Com uma flauta de espumante na mão  atirou-me um beijo e  foi  conviver, quero dizer foi “wordlng” e “worlding” para o meio da refinada e elegante multidão.
Nessa mesma ocasião encontrei a filha dum amigo meu, muito mais pálida do que a mulher-rã, que não gostava de “snorkling” mas “era marada por diving”.
Nessa época eu andava muito ocupado com as minhas absorventes actividades de “counselling”“teaching”“travelling” e “writing”. Talvez por isso descuidara estas garoupas tão interessantes que iam às profundezas com os PTs para conhecerem o linguado do Mar Vermelho ou admirarem de perto o lingueirão do Mediterrâneo.
Por estes escassos e singelos exemplos, conclui-se que falar línguas é bacanaacojonanteswellfantastiquebarildo canecobué da fixe. No fundo, a tal língua portuguesa serve só para ser assassinada em acordos miseráveis que todos assinam mas ninguém pratica, a não ser para dar pontapés na gramática.
Publicado no Minho Digital

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3 Comments:

Blogger 500 said...

Bolas, podia ter escrito em linguagem que eu conhecesse.

20 de outubro de 2017 às 22:42  
Blogger José Batista said...

Um mega-hiper-super texto.
Com uma parte final (as últimas três linhas) de arromba.
Parabéns.
Obrigado.
Abraço.

JB

20 de outubro de 2017 às 23:12  
Blogger Ilha da lua said...

E,o que posso dizer deste texto ?Só posso dizer...é bué da fixe!!!

20 de outubro de 2017 às 23:24  

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