PATUÁ
Por Joaquim Letria
Venho hoje pôr-vos em cima da mesa uma modesta crónica que mais não pretende do que vos apontar à luz no fundo do túnel, vós que sois meus leitores da linha da frente, enfrentando as dificuldades que combateis com uma robusta decisão que vos dá a garantia que vos levará a implementar os objectivos de todos nós com inigualável resiliência.
O que digo no parágrafo anterior mais não significa do que “escrevo uma modesta crónica que poderá ajudar a encontrar a solução para aqueles que enfrentam a vida difícil por que passamos, enfrentando os problemas com a sólida decisão que garante atingirem os objectivos colectivos com uma resistência sem igual”.
Estes dois parágrafos podem significar a mesma coisa, ainda que escritos do modo diverso e utilizando palavras distintas, mas ambos com o mesmo propósito. Também um e outro poderiam ser redigidos de forma diferente e ainda assim quererem ter o mesmo significado.
Escrevo ambos com o propósito de vos mostrar como no primeiro utilizo termos e expressões que se vão transformando em lugares comuns. Hoje, se prestarem atenção, nos meios áudio visuais e na Imprensa escrita diz-se e escreve-se com toda a naturalidade estas palavras que não sendo novas se vão introduzindo e fixando num novo léxico que já ninguém estranha. Notem como usamos os termos de “em cima da mesa, de luz ao fundo do túnel, linha da frente, orçamentos de Estado robustos" e como implementamos e somos resilientes e servimo-nos de bordões como ”ainda assim”.
Dirão os de hoje que tal fenómeno é expectável, diriam os mais antigos como eu que isto que está a acontecer seria de esperar. Não quero dizer que uns e outros não têm razão e que uma coisa e outra significam coisas diferentes, com uns a estarem certos e outros errados. Nada disso. As línguas têm vida própria e transformam-se e ganham formas diferentes daquelas que tinham à nascença. Essa é uma diferença fundamental entre as línguas vivas e as línguas mortas.
Reparem como os termos que cito acima estão no nosso uso. Alguns dicionários transmitem-nos dúvidas. Mas também essas serão uma questão de tempo. No Morais, implemento significa cumprimento de uma obrigação, de um contrato, implementar é promover, levar a efeito; já resiliência não existe no Morais nem no Houaiss, que dão sim conta de resiliação (essa existe) com o verbo resilir, que significa arrepender-se, negar-se ao cumprimento de pacto ou contrato, invalidar, rescindir. Por outro lado, o Dicionário da Língua Portuguesa reconhece resiliência e implementar tal como os vemos serem utilizados hoje em dia.
Moral da História: vamo-nos entendendo assim, neste patuá (ou patois), antes de fugirmos para a linguagem virtual que essa, qualquer dia, com tantas conferências de Imprensa, todos nós acabamos por falar tão impecavelmente como qualquer surdo ou surdo-mudo.
Publicado no Minho Digital
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