O saque dos casamentos
Por Joaquim Letria
Nos três últimos casamentos para que fui convidado, os noivos não aceitavam prendas em géneros nem sugeriam artigos que gostassem de ter ou que lhes pudessem dar jeito ou lhes fizessem falta.
Disseram, descaradamente, que “a gente tem tudo, o que queremos é que nos dêem dinheiro vivo.” Agora mesmo me convidaram para outra boda destas em Outubro.
Num desses casamentos de que falo, o noivo que era engenheiro não teve mesmo pejo em me dizer:
— Eu dou-lhe o NIB e depois você manda-me o comprovante.
Já não podemos oferecer uma lua de mel requintada de que jamais se esqueçam, um faqueiro de prata ou casquinha “comme il faut”, um serviço de Vista Alegre, Sévres ou Limoge, ou lençóis e almofadas de linho, seda e penugem de avestruz. Isso acabou, que nem eles sabem do que se trata nem apreciam.
Acabaram também as listas numa boa casa ou armazém, onde se podia consultar as necessidades dos noivos e aquilo que muito agradeceriam que lhes oferecessem, de electro-domésticos a tudo o que fizesse falta a uma casa a estrear. Agora é tudo resumido a “dinheiro, eu mando-lhe o NIB e não se esqueça do comprovante”.
Claro que o comprovante, julgo eu, é para que os ofertantes sejam generosos e tenham vergonha de dar pouco, ou sejam sem vergonha, como os noivos, e se pendurem num copo de água cada vez mais foleiro e mal servido. Ou seja, os actuais casamentos estão transformados num puro acto de extorsão suave.
Ao contrário da maioria, eu gosto de pagar impostos. Penso mesmo que pagar impostos é comprar a nossa felicidade – na saúde, na educação, nas casas, nos transportes, etc.. Aprendi a sentir e a pensar assim quando vivi no Reino Unido. O que não gosto é do que fazem e não fazem com o dinheiro dos nossos impostos. Mas isso é outra coisa de que todos nós temos muito justamente razões de queixa.
Perguntarão vocês com toda a justiça: que raio têm os impostos a ver com os casamentos?
Eu explico: é que se o fisco investiga e cobra o crowd funding, se penaliza petições e ofertas a instituições, movimentos de solidariedade e doações a doentes necessitados, também devia ir aos noivos, investigarem os NIBS e as comprovantes e aplicar-lhes a pastilha. Não lhes ensinava boas maneiras mas explicava-lhes que é bonito partilhar a riqueza.
Publicado no Mundo Digital
Etiquetas: JL
1 Comments:
No meu tempo e mais recentemente dava-se dinheiro num envelope. Não era sigiloso.
Quanto à sua conclusão; só a mesquinhez e abutragem investiga ridículos valores.Creio até que partiu dos tipos Sérios do PS.
AS off-shores não investigam eles.
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