5.1.05

Todos-os-Santos... são poucos!

QUANDO, há dias, o país foi abalado por um forte sismo, perguntaram a um responsável dos bombeiros de Lisboa se estávamos preparados para um terramoto de grandes proporções. Felizmente, a resposta foi dada com um sorriso nos lábios, o que permitiu amaciar o seu teor: «Não, não estamos. Ficaríamos dependentes da ajuda internacional».

Ora, o facto de o maremoto do passado dia 26 ter demorado duas horas a chegar à Índia (e umas quatro para atingir África) dá que pensar: apesar dos satélites, da internet, dos telemóveis, dos faxes, dos telefones, da rádio e da TV, não foi possível avisar ninguém - tendo morrido muitos milhares de pessoas que poderiam ter sido salvas. Foi, porventura, a mais grave e inimaginável manifestação de incompetência de que há memória por parte de governos e organizações responsáveis.

Claro que não podemos deixar de nos questionar: «E se tivesse sido em Portugal, país onde nem sequer os parquímetros funcionam?». Se calhar, a resposta vai ser dada quando se comemorarem, precisamente, os 250 anos da catástrofe do dia de Todos-os-Santos de 1755.
Estou a imaginar os encarregados dessas coisas (os da altura e os seus antecessores), reunidos num palanque no Terreiro do Paço, com um olho na assistência e outro, de soslaio, no Tejo. Se, depois dos empolgantes discursos, algum cidadão lhes pedir contas do que têm feito, responder-lhe-ão que, para além de terem apelado à Senhora de Fátima, já nomearam uma comissão para estudar se se deve dizer «maremoto» ou «tsunami».

Resumindo: se um dia destes vier por aí uma onda gigante, o leitor fará o mesmo que toda essa gente tem feito por si: nada.
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NOTA: Uma versão simplificada deste texto foi publicada no «Expresso» de 8 de Jan 05 em «Carta Branca».

3 Comments:

Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

Este texto estava muito longo para a Carta Branca do «Expresso», pelo que foi feita uma versão mais curta:


Quando, há dias, o país foi abalado por um sismo, perguntaram a um responsável dos bombeiros se estávamos preparados para um de grandes proporções. Felizmente, a resposta foi dada com um sorriso nos lábios, o que permitiu amaciar o seu teor: «Não, não estamos. Ficaríamos dependentes da ajuda internacional».

Claro que não podemos deixar de nos questionar: «E se o maremoto da Ásia tivesse sido cá, onde nem os parquímetros funcionam?». Se calhar, a resposta vai ser dada quando se comemorarem, precisamente, os 250 anos da catástrofe de 1755.

Estou a imaginar os encarregados dessas coisas, reunidos no Terreiro do Paço, com um olho na assistência e outro, de soslaio, no Tejo. Se, depois dos empolgantes discursos, algum cidadão lhes pedir contas do que têm feito, responder-lhe-ão que, para além de terem apelado à Senhora de Fátima, já nomearam uma comissão para estudar se se deve dizer «maremoto» ou «tsunami».

Resumindo: se um dia destes vier por aí uma onda gigante, o leitor fará o mesmo que toda essa gente tem feito por si: nada.

5 de janeiro de 2005 às 18:17  
Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

Curiosidade:

Num inquérito "online" do «Correio da Manhã», pergunta-se aos leitores-cibernautas se acham que Portugal deve ter prevenção contra este género de catástrofes.

A pergunta parece disparatada, mas não é, pois em mais de 5400 pessoas que responderam até hoje, 15% acha que não!

11 de janeiro de 2005 às 09:17  
Anonymous Anónimo said...

http://ultimahora.publico.pt/shownews.asp?id=1213228&idCanal=90:

«Há quatro anos que o Serviço Regional de Protecção Civil dos Açores (SRPCA) está a aguardar a aprovação do Plano Regional de Emergência do arquipélago. O documento foi enviado em 2001 para o Serviço Nacional de Protecção Civil — entretanto extinto e substituído pelo Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil (SNBPC) —, o organismo responsável por analisar o documento, mas as entidades regionais nunca receberam qualquer resposta.

Depois de feita esta avaliação, o plano deveria ter sido apresentado na Comissão Nacional de Protecção Civil (CNPC), um órgão de assessoria técnica que funciona na dependência da Ministério da Administração Interna (MAI), que emitiria um parecer prévio sobre o plano. Só depois o documento poderia ser aprovado pelo Governo regional.

O SNBPC não nega o atraso. “A última vez que a comissão reuniu foi em Janeiro de 2002 e nessa altura a análise do plano não estava pronta e, por isso, ele não foi levado a votação”, explica uma fonte oficial da instituição. “Depois a comissão nunca mais se reuniu e, por isso, não houve oportunidade para dar o parecer”, completa a mesma fonte.

As reuniões da CNPC são marcadas pelos responsáveis do MAI, normalmente sob proposta do SNBPC. Esteve previsto um encontro para Dezembro passado, mas a demissão do presidente do serviço e a queda do Governo acabaram por levar ao seu adiamento.

Os novos responsáveis do SNBPC asseguram que a análise do plano regional já está concluída e que só falta realizar a reunião da comissão. “Vamos fazer uma proposta para que seja marcado brevemente um novo encontro, mas com a actual situação política não sabemos quando é que isso acontecerá”, refere o responsável do SNBPC.

Em caso de tragédia “os Açores terão de se reger pelos planos de emergência municipais, o que não é suficiente já que existe um número elevado de entidades que não estão directamente ligadas Protecção Civil e cuja colaboração considerada de vital importância para socorrer as populações”, disse ao PÚBLICO o responsável pelo SRPCA, António Cunha.

“Não há cadeia de comando”

O Plano Regional de Emergência começou a ser elaborado depois do sismo de 1998 nas ilhas do Faial e Pico e pretendeu colmatar algumas das lacunas detectadas durante as operações de socorro aos desalojados. O documento “tem por objectivo articular a acção de várias entidades na resposta a catástrofes ocorridas em qualquer local do arquipélago, nomeadamente a Empresa de Electricidade dos Açores, os CTT, as administrações portuárias e aeroportuárias, ou a PSP, entre outras. São serviços que não têm ligação regular à Protecção Civil, mas considerados essenciais na resposta a catástrofes naturais. Se acontecer alguma coisa, actualmente, não há qualquer cadeia de comando para poder articular o trabalho de todas estas entidades”, adiantou o mesmo responsável.

Estranho, segundo António Cunha, é o silêncio que tem envolvido a homologação do documento: “Nos últimos quatro anos já mandei seis ofícios a questionar o paradeiro do plano e nunca recebi qualquer resposta. Não fazemos a mínima ideia do que é feito da documentação porque até hoje ninguém me respondeu a nada”, disse. “Aliás”, acrescentou, “durante todo este tempo apenas fui convocado uma vez para uma reunião da Comissão Nacional de Protecção Civil. Não me indicaram a agenda e a convocatória até acabou por chegar já durante este mês de Dezembro. Curiosamente, no dia em que o presidente do SNBPC apresentou o pedido de demissão.”

A única certeza do responsável do SRPCA é a da “urgente necessidade de remodelação do documento”. António Cunha classifica o plano elaborado em 2001 como “completamente desactualizado” e assume que, após a aprovação do parecer, “serão iniciados imediatamente os trabalhos necessários para o renovar profundamente”.

Os Açores são a região do país onde é maior o risco de ocorrência de catástrofes naturais, em especial por causa da sua origem vulcânica».

16 de janeiro de 2005 às 19:38  

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