14.12.05

A Marca da D. Rosa

Aventuras e desventuras
de Jeremias
na Sociedade da Informação

- Olha lá, tu viste o filme do Zorro?

Confesso que esperava tudo menos esta pergunta, pelo telefone, logo às 7h da manhã, quando ainda me espreguiçava – era o meu amigo Januário, que se debatia com algum problema grave. (...) - Texto integral em «Comentário-1»

1 Comments:

Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

A Marca da D. Rosa

- Olha lá, tu viste o filme do Zorro?

Confesso que esperava tudo menos esta pergunta, pelo telefone, logo às 7h da manhã, quando ainda me espreguiçava – era o meu amigo Januário, que se debatia com algum problema grave.

Demorei um pouco até estar bem desperto, e depois respondi-lhe que não tinha visto o filme, mas conhecia bem a personagem dos antigos livros de quadradinhos.

- Também serve. – Respondeu-me ele, nervoso – Lembras-te, então, como era a famosa Marca-do-Zorro?

Claro que me lembrava! Algures no decorrer da acção o herói, com a sua espada, desenhava um "Z" num sítio qualquer, que tanto podia ser a parede do fundo como a testa do adversário. E foi isso que lhe respondi.

Mas ele queria saber uma coisa muito especial:

- E lembras-te se esse “Z” tinha tracinho?

Essa era demais!

- Qual tracinho?! – Perguntei, estupefacto.

- O tracinho do meio, qual é que havia de ser! Então não sabes que há quem desenhe o “Z” com um tracinho, assim como se faz nos "t"?

De facto, era verdade! Da mesma maneira que há quem ponha um tracinho no número "7" (e há quem não o ponha), passa-se o mesmo com o "Z"!

Mas, em vez de lhe perguntar para que é que ele queria saber uma coisa tão esquisita, limitei-me a pedir-lhe que me desse algum tempo para investigar!
*
Desliguei o telefone e, ainda mal acordado, liguei-me à Internet e fiz uma rápida pesquisa em "Zorro"; e, pelo que descobri, parece que a tal Marca-do-Zorro não tem (ou não tinha…) o tal tracinho. Deparei até com um brincalhão, que abordava o assunto num fórum dizendo que o herói abolira o tracinho na “Z” para poder fugir mais depressa dos locais dos duelos, pois sempre eram 25% de risquinhos a menos que ele tinha de fazer (três, em vez de quatro)!

Liguei então para o Januário para lhe dar a resposta, mas ele tinha o telemóvel impedido – talvez andasse a telefonar para outras pessoas a fazer a mesma pergunta... Entretanto, fizera-se tarde (estavam à minha espera na Geronto-Teknica) e não insisti nem deixei mensagem, até porque isso iria ser um interessante assunto para debater durante o almoço…
*
E assim foi.

No refeitório da empresa (onde eu nesse dia almoçava), resolvi mudar o assunto das conversas dos que só falavam de bola e perguntar se alguém sabia se o “Z” (em geral) e a Marca-do- Zorro (em particular) tinham tracinho ou não…

Bem... só vos digo que os que estavam na minha mesa ficaram a olhar para mim com cara de parvos. E ainda por cima o Dr. Pirilampo, que é um grande brincalhão e achou imensa graça à minha dúvida, levantou-se e, depois de chamar a atenção dos comensais batendo as palmas, informou, com o seu vozeirão:

- Aqui o nosso amigo quer saber se a Marca-do-Zorro tem um tracinho ou não!

Mas, para grande espanto dele e meu, ninguém se riu!

E só se ouvia cochichar:

«Eu acho que tem»
«Eu acho que não tem»
«Eu acho que já teve mas agora não tem»
«Boa pergunta!»
«Esqueçam… ele deve ser mas é maluco»

Ora o meu amigo Carlos Pinheiral, que estava presente e sabe tudo sobre banda-desenhada, pensou... pensou... e, deixando o almoço a meio, saiu a correr, meteu-se no carro, e foi a casa, de propósito, para rever os álbuns do grande justiceiro!

E, a meio da tarde, já depois de eu ter posto até os directores-gerais a fazerem pesquisas na Web, já estava em condições de garantir ao Januário que a tal Marca-do-Zorro, pelo menos nas representações encontradas, não tinha tracinho!

- Bem me parecia! – Foi o seu lacónico comentário quando lhe telefonei a dar conta das minhas diligências.

Essa resposta, e mais ainda o seu tom (de quem se limitava a constatar uma evidência), irritaram-me de sobremaneira, pois era a prova de que ele não dava valor nenhum aos esforços ciclópicos que a sua pergunta desencadeara!

Chegara, pois, a minha vez de lhe fazer perguntas, e eu quis saber, explicado tim-tim-por-tim-tim, qual era o verdadeiro problema.

- Sabes lá o que me aconteceu! - E fez uma pausa para aquilatar do meu grau de curiosidade.

Fiz-lhe a vontade, não precisei de fingir para me mostrar ansioso pela resposta, e ele prosseguiu:

- Resolvi anunciar os meus serviços em todos os jornais da manhã. Rascunhei o texto, dei-o à D. Rosa para ela o dactilografar no computador, e ela, no sábado, veio cá e tratou de tudo sozinha.

- Então qual é o problema? – Indaguei eu, cada vez mais confuso – Devias estar satisfeito por teres transformado uma profissional-da-limpeza numa secretária tão eficiente!

- O problema é o excesso de eficiência da senhora!

Perante o meu silêncio de incompreensão, contou o resto da história.

- É que ela, depois de escrever no computador o que eu lhe tinha mandado, imprimiu várias cópias sem me mostrar e levou-as a uma agência para meter grandes anúncios nos jornais de amanhã. Depois apagou o ficheiro de texto do computador e foi para a terra, onde está incontactável pois lá o telemóvel dela não tem rede…

- Percebo… – comentei eu, compreensivo –, agora estás preocupado com as contas que vais ter de pagar! De facto, os anúncios custam uma fortuna…

- Nada disso! É que eu receio que ela se tenha enganado a escrever a frase publicitária...

Vim, depois, a saber os pormenores – e a relação que o texto tinha com o risquinho do “7” e a tal «Marca-doZorro»:

É que a frase do anúncio que ia sair era:

APROVEITE OS NOSSOS SERVIÇOS! DINAMIZAMOS O SEU NEGÓCIO

Até aí, é claro, não via onde podia estar o mal.

- O problema é que, como sabes – concluiu o Januário –, eu não tenho muita paciência para usar o computador, por isso escrevi o anúncio à mão, como te disse, e dei-lhe o papel para ela tratar disso. Ora, além de a minha caligrafia não ser grande coisa, eu escrevo os "Z" com um risquinho no meio. Depois do que me disseste, estive a ver o papel que lhe dei e, na palavra «dinamizar», receio bem que a D. Rosa tenha confundido o "z" com um "t"...

14 de dezembro de 2005 às 09:47  

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