O ministro e o moribundo (*)
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De qualquer forma, podia tê-lo feito sem recorrer a uma mentirita (que, de tão ridícula, nem o chega a ser...) - bastava-lhe agir como o homem que quis animar um amigo que estava à morte e a quem disse, com um sorriso de orelha a orelha:
- Ah, grande maroto! Com que então moribundo... e não dizias nada à malta, hem?
-
(*) Publicado no «DESTAK» de 17 Out 06 e no «metro» do mesmo dia - mas, neste, com corte da parte final e o título alterado!
2 Comments:
É impressão minha ou este ministro foi o maior erro de casting de José Sócrates ?
A crise acabou
Eduardo Dâmaso («DN» de 15 Out 06)
O ministro da Economia deu na sexta--feira a grande notícia: "Eu acho que a crise acabou totalmente", disse Manuel Pinho. Depois arrependeu-se e corrigiu o tiro, mas produziu uma declaração ainda mais surpreendente do que a primeira: "Não se decreta o fim de uma crise. É um bocadinho infantil (...), o que eu quero dizer é que não é bom falar de crise."
Estonteante? Não, só um bocado confuso. O ministro acha-se infantil? O ministro acha que a crise acabou completamente, só um bocadinho ou que ela não acabou de todo mas não é bom andar sempre com a crise na boca?
Num país melancólico, é sempre bom haver ministros bem-dispostos, que sabem que atacam a maldita crise existencial dos portugueses com uns ditos que puxam à gargalhada. Afinal, terá sido esse o caso. O ministro queria pôr os portugueses a rir um bocado. Até porque, que diabo, a crise é relativa. Tecnicamente, não estamos em recessão porque a economia cresce há vários trimestres consecutivos. Tecnicamente, a administração pública está a ser "desengordurada", para usar a palavra do ex-dirigente socialista Jorge Coelho. Tecnicamente, a mesma receita está a ser aplicada na saúde, na educação. Tecnicamente, só temos razões para estar felizes. Portanto, abaixo a crise! "Desengordure-se" a crise!
O problema é que a crise existe cada vez menos "tecnicamente", mas ela persiste em manter-se na vida real de muitos portugueses. Desde logo, na vida daqueles que vão pagar mais pelas novas taxas moderadoras e que, ainda por cima, levam uma reprimenda de uma antiga ministra da Saúde socialista como se fossem uns malandros que queriam tudo de borla a vida inteira. Ou na vida dos idosos que não têm dinheiro para pagar medicamentos. Ou das famílias que gastam todos os anos uma fortuna em livros e materiais escolares, alojamento e transporte de filhos que estudam fora da área de residência. Ou dos jovens licenciados que não encontram emprego. Ou dos operários que vêem as fábricas fechar.
A crise também só existe na solidão dos velhos que vivem em prédios degradados de onde não conseguem sair anos a fio. Ou na vida das largas centenas de milhares de pessoas que vivem em Portugal abaixo do limiar da pobreza e, em particular, nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. O radioso optimismo de Manuel Pinho ainda há-de chegar um dia a estes portugueses, mas, por agora, não dá para gloriosos amanhãs que cantam. Júbilo tamanho só mesmo no espírito do ministro.
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