Cristais de colesterol
AO DEDICAR-SE AO ESTUDO DO COLESTEROL, o botânico Friedrich Reinitzer (1858–1927) descobriu que um seu derivado, o benzoato de colesterilo, tem um comportamento estranho. Aquecendo-se a 145,5 ºC, torna-se num líquido turvo e pastoso. Prosseguindo o aquecimento até 178,5 ºC, torna-se transparente. Reinitzer não percebeu o que se passava, nem se esse facto viria a ter alguma utilidade, mas não desistiu de perceber o fenómeno.
O cristalógrafo Otto Lehmann (1855–1922), consultado pelo botânico, estudou o composto com o seu microscópio de luz polarizada e notou um facto extraordinário. Descobriu que no líquido fluíam pequenos cristais — por vezes chamados cristalitos. Revelou essa descoberta num artigo de 1889 em que dava conta da sua surpresa: «Cristais que fluem! Não estaremos perante uma contradição de termos?» E assim parecia.
Refeitos da surpresa, os cientistas, também sem imaginarem que isso poderia ter alguma utilidade imediata, começaram a estudar intensamente os cristais líquidos. A história dessa pesquisa encontra-se num livro de Tim Sluckin agora editado pela IST Press. Intitula-se «Fluidos Fora da Lei» e conta as peripécias destes mais de cem anos de investigação. O final feliz estamos a vivê-lo todos, com dispositivos simples, eficientes e baratos nos termómetros, nos computadores e nos mostradores das máquinas de calcular. Nestas usam-se cristais líquidos que se dispõem entre duas placas de vidro polarizado, deixando passar a luz. Quando se aplica uma corrente eléctrica, os minúsculos cristais alinham-se, tal como uma colecção de pequenos ímanes, e a luz não passa. Simples e eficiente. Afinal, valeu a pena estudar o colesterol ao microscópio.
Adaptado do «Expresso»
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