1.4.07

Pressões

DURANTE A CAMPANHA ELEITORAL, Cavaco houve por bem criar dois constrangimentos a si mesmo. O primeiro foi o de colocar lá muito em cima a fasquia das expectativas sobre o futuro próximo do país - sobretudo por isso, em grande parte, não depender do Presidente da República. O segundo, que veio em auxílio do primeiro, foi substituir a solidariedade institucional (que se apoia na Constituição, que a maioria aplaude e que ninguém ousa contestar) pelo conceito de "cooperação estratégica", o qual, mesmo se difuso, é algo aventureiro. Porque o Presidente isenta-se de responsabilidades na governação por genericamente não dispor de poderes executivos. Mas, ao sugerir mais do que pode, ao insinuar uma partilha do esforço (e portanto do mérito) da governação, ele perde margem de manobra e defende-se pelo ziguezague dos excessos: excesso na entrevista televisiva em que, apreciando positivamente a actuação do Governo, ele a quis creditar a um "nós" revelador; e excesso, um mês depois, ao "compreender" as insatisfações e ao definir as quatro áreas específicas em que esperava "resultados" neste ano.
Ora esses pequenos excessos circunstanciais invariavelmente encorajam partidos, comunicação social e movimentos de opinião a tentar condicioná-lo. A manifestação de sábado, em frente do palácio, promovida por alguns vencidos do referendo de 11 de Fevereiro, é disso uma boa ilustração. Aceitou-se em tempo útil a validade política, mesmo que não jurídica, do resultado do referendo. A pergunta posta ao eleitorado foi submetida ao Tribunal Constitucional, que lhe deu luz verde. A votos, o "sim" venceu. A lei, que daí decorreu, cingiu-se aos termos da pergunta votada e o pouco que lhe foi acrescentado foi no sentido de juntar aos deputados da esquerda o voto de uma parte dos deputados do PSD. Nenhuma matéria nova, ponderável em termos de constitucionalidade, foi nela vertida.
Assim sendo, como podia o Presidente remeter o diploma para o Tribunal Constitucional, sem pelo menos ser suspeito de estar a jogar (provavelmente em vão, de resto) na sua nova composição, fomentando assim a instabilidade dos juízos desse órgão? Cavaco não o fez - e bem.
Agora é pressionado para um veto político que ele sabe não ter horizontes. E o facto de ele não o fazer não impede que teria sido melhor para a sua autoridade que a ninguém ocorresse sequer ir pressioná-lo ao palácio.
«DN» de 1 Abr 07

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