15.5.07

PASSEIO ALEATÓRIO

Prazer de saber
Por Nuno Crato
FOI NA SEMANA PASSADA A ENTERRAR um grande amigo da cultura científica. Era professor e chamava-se Artur Marques da Costa. Vítima de paragem cardíaca, deixou muitas saudades entre amigos e conhecidos e muitas coisas inacabadas. Tinha prometido, por exemplo, ir em breve a uma escola no Montijo, onde iria falar aos jovens e mostrar algumas experiências simples que um seu mestre, Rómulo de Carvalho, tinha recomendado e reunido em livro. Tinha muitos outros planos, muitos deles intervenções públicas para jovens, idas a escolas para partilhar o seu gosto pela ciência e pelo saber. Fazia-o graciosamente. Sempre com boa disposição. Estava reformado, e continuava a estar sempre disponível. Gostava verdadeiramente de ciência, e gostava de transmitir esse gosto. Tinha qualidades raras e insubstituíveis, mas partilhava com todos algo que, por vezes, aparece preterido: o prazer em saber.
É uma qualidade mais difundida do que parece, pois é humano gostar de saber e gostar das coisas que se conhecem bem. Infelizmente, no entanto, esse gosto, tão cultivado nos clássicos que nos fizeram sair da barbárie, parece posto em causa pelo utilitarismo e por uma teoria pedagógica enganosa, que vê o saber apenas como uma componente das «competências» práticas e utilitárias.
Os psicólogos sabem-no, os estudiosos não dogmáticos da pedagogia sabem-no e os professores sabem-no melhor que ninguém: não é a motivação vazia que leva ao saber. É necessário saber um pouco para querer saber mais. É necessário saber um pouco sobre Leonardo para querer saber mais sobre Leonardo. É necessário saber um pouco de geometria para querer aprender mais geometria.
Há prazer em saber.
«Expresso» de 12 Mai 07

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