Jornalismo de aproximação
Por Ferreira Fernandes
HÁ ANOS, andei pelos Estados Unidos em reportagem para o livro Os Primos da América. Em Cambridge - agora muito falada porque viviam lá, na Rua Norfolk, os irmãos terroristas chechenos - conheci alguns imigrantes portugueses, o meu assunto. Não longe fica o prestigiado MIT, mas para os lados da Norfolk é América dos pobres, dos imigrantes. Com bares onde os endireitas dão consultas e um português me contou: "Sabe, o meu pai emigrou com 52 anos. Não falava uma palavra de inglês, apanhava o metro, ali, no fim da rua, e perdia-se... Todos os dias, oiça bem, todos os dias, o meu pai chorava antes de ir para o trabalho. Nunca perdoarei isso à América." Palavras de há 20 anos. Mas nunca se ouviu falar daquele meu imigrante. Ele era tão loser, perdedor, como o tio dos terroristas chamou há dias aos sobrinhos, mas esse meu português não tinha aquela justificação demente que faz os radicais islâmicos pousarem a bomba aos pés de famílias e seguirem viagem.
Os meus primos da América às vezes não a perdoam, porque ela é dura, mas quase sempre acabam como os portugueses quando partem: ficam filhos da nova terra, leais. Eu admiro-os. Por isso, quando explodem acontecimentos longínquos e vejo as televisões e jornais de cá a desencantarem os nossos imigrantes (sempre os há) como testemunhas frívolas do lugar mais famoso do noticiário mundial, faço crónica como a de ontem. Terrorista cortou cabelo em barbeiro da Murtosa, pois.
«DN» de 21 Abr 13 Etiquetas: autor convidado, F.F
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