20.7.13

Um País de adivinha

Por Antunes Ferreira
QUAL É a diferença entre a sopa e a mulher? A Dona Otília tem uma frutaria, aliás bem recheada e abrangente, pois inclui naturalmente legumes diversos, mas também pequenas coisas que tornam a loja num pequeno 112: lacticínios, cervejas, águas e refrigerante, aperitivos, e etc., quando deles damos falta é a ela que recorremos. E foi precisamente a Senhora que me lançou o desafio.
Tive de raciocinar, antes de tentar responder, que a pergunta trazia água no bico ou seja, era um bico-de-obra. A Dona Otília olhava-me com um quanto de galhofa, outro tanto de expectativa. Confesso que ela é uma pessoa simpatiquíssima, brincalhona, com os pés bem assentes no chão e possui uma exploração agrícola onde cultiva árvores de fruto diversas e outros mimos. Com uma área de sete hectares, a comerciante é, portanto, pessoa avisada e previdente.
Falávamos da crise política, da posição do PS, das consequências que podiam ter as declarações de Mário Soares, de Manuel Alegre et aliud que pressagiavam confusão dentro dos socialistas, colocando mesmo a hipótese de uma cisão se o partido alinhasse em conclusões das reuniões a rês, sem respeitar a sua identidade e cedesse naquilo que levara para as conversações como questões essenciais defendidas pelos socialistas. Irrevogáveis?
Entrementes, o ministro Portas – de quê? Aparentemente dos Negócios Estrangeiros de que pedira a demissão, essa sim irrevogável? Ou por antecipação, de vice-primeiro-ministro, com as pastas mais significativas e importantes sob o seu comando bem como as negociações com a famigerada troika? Apetece dizer que das duas… três.
Entrementes, o ministro Portas, dizia eu, contactou na terça-feira o seu homólogo boliviano, David Choquehuanca, para emitir uma "palavra de reparação" do (des)Governo e admitir que o Presidente Evo Morales podia “ter razões de queixa" sobre os acontecimentos que decorreram no seu voo de Moscovo para La Paz. Tudo parece indicar que na capital da Bolívia se riram muito perante a anedota.
Na quinta-feira o clímax aconteceu na Assembleia da República onde o (ainda?) primeiro-ministro Coelho, no Parlamento e durante a discussão da moção de censura ao (des)Governo – que, como já se esperava, foi derrotada pelos deputados da (ainda?) coligação que o suporta – dirigindo-se à bancada socialista atirou uma boca: “É o momento de o PS mostrar que sabe assumir a responsabilidade de contribuir activamente para a resolução dos problemas nacionais e de ultrapassar as suas hesitações”. Implicitamente atacou António José Seguro, ainda que não referisse o nome do secretário-geral do Partido Socialista.
Passos, questionado por um deputado comunista sobre a remodelação abortada,  explicou que aquilo que fez foi "um reforço da coligação", chamando para o lugar de vice-primeiro-ministro o presidente do segundo partido da coligação. "E é isso que concretizarei assim que o Presidente da República entender que o esforço que convidou os três partidos a fazer para realizarem um compromisso de futuro possa ter encontrado uma solução positiva".
Por outro lado, António Costa lançou a sua candidatura à presidência da Câmara Municipal de Lisboa, perante uma assembleia em que se destacavam figuras “pesadas” do PS, como Soares, Alegre, Almeida Santos, Maria de Jesus, prometendo que continuaria a governar a capital em “contra-ciclo”. E enunciou os resultados positivos e importantes que já alcançara no seu primeiro mandato do cargo a que se candidatava.
Enquanto tudo isso acontecia, Cavaco, de visita às Selvagens (que viram o seu nome justificado pela presença de tão ilustres personagens) garantiu ainda na quinta-feira iria aceitar a decisão dos partidos "qualquer que ela seja" e alertou que a "pressa pode ser inimiga do bom" nas conversações com vista a um acordo de 'salvação nacional'. " À hora em que escrevo esta crónica, ainda nada se sabia sobre o veredicto do alegado Presidente da República. Sabia-se sim que as negociações entre PSD, CDS-PP e PS continuavam até?...
Aqui chegado, devem os leitores estar a perguntar-se o que tem a ver isto tudo com a pergunta que a Dona Otília fez ao escrevinhador. Então, e dando de barato que a interrogação tem todo o sentido, vamos à decifração do imbróglio. A sopa, quando se mexe, arrefece; a mulher, quando se lhe mexe, aquece. Assim vai a adivinha que é este País…

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