Um País de adivinha
Por Antunes Ferreira
QUAL É a
diferença entre a sopa e a mulher? A Dona Otília tem uma frutaria, aliás bem
recheada e abrangente, pois inclui naturalmente legumes diversos, mas também
pequenas coisas que tornam a loja num pequeno 112: lacticínios, cervejas, águas
e refrigerante, aperitivos, e etc., quando deles damos falta é a ela que
recorremos. E foi precisamente a Senhora que me lançou o desafio.
Tive de raciocinar, antes de tentar responder, que a
pergunta trazia água no bico ou seja, era um bico-de-obra. A Dona Otília olhava-me
com um quanto de galhofa, outro tanto de expectativa. Confesso que ela é uma
pessoa simpatiquíssima, brincalhona, com os pés bem assentes no chão e possui
uma exploração agrícola onde cultiva árvores de fruto diversas e outros mimos.
Com uma área de sete hectares, a comerciante é, portanto, pessoa avisada e
previdente.
Falávamos da crise política, da posição do PS, das
consequências que podiam ter as declarações de Mário Soares, de Manuel Alegre et aliud que pressagiavam confusão
dentro dos socialistas, colocando mesmo a hipótese de uma cisão se o partido
alinhasse em conclusões das reuniões a rês, sem respeitar a sua identidade e
cedesse naquilo que levara para as conversações como questões essenciais
defendidas pelos socialistas. Irrevogáveis?
Entrementes, o ministro Portas – de quê? Aparentemente dos
Negócios Estrangeiros de que pedira a demissão, essa sim irrevogável? Ou por
antecipação, de vice-primeiro-ministro, com as pastas mais significativas e
importantes sob o seu comando bem como as negociações com a famigerada troika?
Apetece dizer que das duas… três.
Entrementes, o ministro Portas, dizia eu, contactou na
terça-feira o seu homólogo boliviano, David Choquehuanca, para emitir uma
"palavra de reparação" do (des)Governo e admitir que o Presidente Evo
Morales podia “ter razões de queixa" sobre os acontecimentos que
decorreram no seu voo de Moscovo para La Paz. Tudo parece indicar que na
capital da Bolívia se riram muito perante a anedota.
Na quinta-feira o clímax aconteceu na Assembleia da República
onde o (ainda?) primeiro-ministro Coelho, no Parlamento e durante a discussão
da moção de censura ao (des)Governo – que, como já se esperava, foi derrotada
pelos deputados da (ainda?) coligação que o suporta – dirigindo-se à bancada
socialista atirou uma boca: “É o momento de o PS mostrar que sabe assumir
a responsabilidade de contribuir activamente para a resolução dos problemas
nacionais e de ultrapassar as suas hesitações”. Implicitamente atacou António
José Seguro, ainda que não referisse o nome do secretário-geral do Partido
Socialista.
Passos, questionado por um
deputado comunista sobre a remodelação abortada, explicou que aquilo que fez foi "um
reforço da coligação", chamando para o lugar de vice-primeiro-ministro o
presidente do segundo partido da coligação. "E é isso que concretizarei
assim que o Presidente da República entender que o esforço que convidou os três
partidos a fazer para realizarem um compromisso de futuro possa ter encontrado
uma solução positiva".
Por outro lado, António Costa lançou a sua candidatura à
presidência da Câmara Municipal de Lisboa, perante uma assembleia em que se
destacavam figuras “pesadas” do PS, como Soares, Alegre, Almeida Santos, Maria
de Jesus, prometendo que continuaria a governar a capital em “contra-ciclo”. E
enunciou os resultados positivos e importantes que já alcançara no seu primeiro
mandato do cargo a que se candidatava.
Enquanto tudo isso acontecia,
Cavaco, de visita às Selvagens (que viram o seu nome justificado pela presença
de tão ilustres personagens) garantiu ainda na quinta-feira iria aceitar a
decisão dos partidos "qualquer que ela seja" e alertou que a
"pressa pode ser inimiga do bom" nas conversações com vista a um
acordo de 'salvação nacional'. " À hora em que escrevo esta crónica, ainda
nada se sabia sobre o veredicto do alegado Presidente da República. Sabia-se
sim que as negociações entre PSD, CDS-PP e PS continuavam até?...
Aqui chegado, devem os leitores estar a perguntar-se o que
tem a ver isto tudo com a pergunta que a Dona Otília fez ao escrevinhador.
Então, e dando de barato que a interrogação tem todo o sentido, vamos à
decifração do imbróglio. A sopa, quando se mexe, arrefece; a mulher, quando se
lhe mexe, aquece. Assim vai a adivinha que é este País…
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