Swapar é preciso
Por
Antunes Ferreira
“NAVEGAR é preciso, viver não é
preciso” escreveu Fernando Pessoa e cantou (e canta) Chico Buarque de Hollanda;
a conjugação destes dois mestres (sem cuidar da dimensão de cada um deles)
resultou em afirmação cantada que se tornou paradigmática em Portugal. Hoje,
porém, Pessoa seria muito capaz de, iconoclasta como foi, versejar de outra
forma: “Swapar é preciso, ter vergonha não é preciso”. E logo se levantaram
vozes mais eruditas ou mais susceptíveis: Mas quem é este gajo que se dá ao
luxo de inventar o “verbo” swapar?
Este
caso dos já calinos e prostituídos swaps (continuo à espera de alguém que
bondosamente tente traduzir a expressão para Português… mas numa só palavra, já
que o que quer dizer é demasiado comprido e demasiado ininteligível para o
pobre lusitano das classes médias, baixas e assim – assim) tornou-se em leit
motiv, neste pobre País, seja em conversas, seja em debates, seja em audições
na comissão que “investiga” os malfadados contratos, seja nas páginas dos
jornais, seja ainda nas redes sociais cada vez mais soberanas.
A
meio da semana e depois da ministra Maria Luís ter afirmado na dita comissão da
Assembleia da República que não fora informada por ninguém sobre o escaldante
assunto, o facto de ter reconhecido, antes, que sabia duns zuns zuns a respeito
do caso, o assunto ainda mais aqueceu. Aliás já o ex-ministro Gaspar afinara
pelo mesmo diapasão, o que não admira, pois a actual detentora do ministério
tinha sido sua secretária de Estado das Finanças, e os swaps tinham sido motivo
que o obrigara a desistir do cargo, para além dos inúmeros erros de contas e
previsões falhadas et aliud, que ele
próprio reconhecera na sua carta de demissão.
No
entanto, a governanta, perdão, a governante, ao defender a honra conjunta de
ministros encarregados dos assuntos financeiros, levou o tema mais longe, ao
declarar que o ex-secretário de estado do Tesouro, Costa Pina do então titular,
Teixeira dos Santos, não lhe dissera nada de importante a respeito dos tais
swaps, o que correspondia, a chamar-lhe mentiroso.
Costa
Pina não gostou. E não esteve com meias medidas; enviou uma carta à supracitada
comissão em que acusou Maria Luís Albuquerque de deturpar as suas palavras e de
omitir a informação que Vítor Gaspar lhe passou, mantendo tudo o que disse na comissão
de inquérito aos swaps. Mas, não se ficou por aqui: garantiu que mantinha tudo o que dissera, depois da agora
ministra das Finanças ter dito na terça-feira, em comissão, que ele tinha
"falhas graves de memória".
Estavam as coisas
neste pé, com a Oposição a exigir a demissão da ministra, quando Cavaco uma vez
mais atirou achas para a fogueira. Porque Passos lhe garantira que Maria Luís
era pessoa idónea e competente, ele, suposto PR - que nunca tem dúvidas e raras
vezes erra - era da mesmíssima opinião: mantenha-se a ministra. Tantas trocas e
baldrocas eram suficientes para outra atitude que Cavaco tomasse? Não eram.
Além disso, o Senhor Silva não costuma ter atitudes. A não ser em favor do
(des)Governo Portas-Passos, que é a ordem correcta.
Eis senão quando, a
revista Visão, que é uma desmancha-prazeres do mais alto coturno, divulgou que
o agora secretário de Estado do Tesouro, Joaquim Pais Jorge, à data (Julho de
2005) director do Citibank Coverage, terá proposto ao gabinete de José Sócrates
a venda de três contratos de swaps ao Citigroup, com base em derivados
financeiros. “Os Estados geralmente não providenciam [ao Eurostat] informação
sobre o uso de derivados”, dizia o documento entregue no gabinete do então primeiro-ministro
e também ao Ministério das Finanças e ao IGCP, organismo que gere a dívida
pública. “Os swaps serão, efectivamente, mantidos, fora do balanço”,
acrescentava o documento. Ora, como é sabido, o Eurostat é o gabinete de
estatísticas europeu que calcula o défice orçamental e a dívida pública dos
Estados-membros.
Aqui d’el Rei. Logo a negregada Oposição pediu a demissão de
Pais Jorge, com relevo maior do BE e do PCP. João Semedo, o coordenador dos
bloquistas afirmou mesmo que o caso dos contratos continuava a "adquirir
contornos escabrosos", acrescentando que "temos uma ministra que
contratou swaps enquanto gestora de uma empresa pública e temos agora um
secretário de estado que, enquanto gestor de um banco, vendia esses contratos swaps.
Ou seja, no mesmo governo temos quem os comprava e quem os vendia".
Perante esta salgalhada, quem se pode admirar de eu ter
criado o verbo swapar?
Etiquetas: AF
3 Comments:
Também se pode tentar o aportuguesamento. Eu proporia: "suópes". Com o significado de patifarias financeiras feitas por entidades e pessoas pouco confiáveis com a intenção de sacar dinheiro a gente séria, desprevenida e desprotegida. E para dar mais consistência ao neologismo, invocava-se um acordo ortográfico restrito e específico, decompondo a palavra do seguinte modo:
- as primeiras três letras relacionar-se-iam (espuriamente) com "suor";
- a letra "p", a seguir, viria de pobres;
- a letra "e" significaria "escorropihchado" (que soa adequadamente, para o efeito);
- e a letra "s" significaria (duplamente) "sórdidas" e "sanguessugas".
E a quem argumentasse que um tal arrazoado não tem jeito nenhum repliar-se-ia que isso era obrigatório como condição para se aproximar o vocábulo do verdadeiro e último significado da coisa.
Confuso?
É como os suópes.
O Zé Batista, eu escrevia Baptista, mas agora parece que é erro de palmatória, se não existisse tinha de ser existido. Continuo a gostar de fazer palavras novas.
Mas a sugestão dos "suópes" e a explicação dada não se coadunam com qualquer hipótese de crítica. Está bem feita e bem apresentada de mais. Ponto final. Nada de pontos: os meus parabéns a este Batista mascarilhado - outra palavra nova. Tenho de as registar. Ou registrar como dizem os Brasucas.
Faz muito bem em inventar, caro Antunes Ferreira. E que invente por muitos e bons anos, com proveito meu e de outros.
Agora, este Batista não está mascarilhado. Terá sido um erro no registo de baptismo do meu avô, que sempre gostou da palavra assim mesmo, talvez por não praticar qualquer religião.
Aproveito para corrigir dois erros no comentário que tinha feito anteriormente:
- "escorropichado" e não escorropihchado";
- "replicar-se" e não "repliar-se".
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