E, no entanto, a Terra e os homens rolam
Por Ferreira Fernandes
ONTEM,
no aeroporto de Luanda, as fuselagens de quatro aviões da TAAG
anunciavam: "Angola 2013 - 41.º Mundial de Hóquei em Patins." Vai ser
neste setembro, em Luanda e na antiga Moçâmedes. Da sala de espera, eu
olhava para os anúncios com o mesmo prazer com que, na véspera, lera num
restaurante modesto das Ingombotas: "Á bacalhau com todos." Entrei,
encomendei e não emendei. Arriscava-me a que a dona varresse a falta do
h: "E você leste peixe espada?"
Um mundial de hóquei já esteve para
acontecer em Angola em 1975, mas o ano da independência impediu-o. Nos
anos quentes que se seguiram, João Cruz, filho de uma muxiluanda, negra
da ilha de Luanda, insistiu em treinar jovens para um desporto que
muitos diziam não ser da terra. Mas no prato ou sob patins há sempre
pegadas que ficam. Isso filosofava eu, quando um companheiro de espera
me desviou a atenção para um casalito chinês. Os pais falavam mandarim
ou cantonês, não sei, mas os dois garotos cantavam "Atirei o pau ao
gato..." O meu ocasional companheiro voltava a Torres Vedras depois de
três meses a colocar pladur em casas luandenses. Chamava-se Camões,
estas coisas não se inventam, e ainda em maio, aos 48 anos, nunca tinha
tido um passaporte, nem ido ao estrangeiro ou viajado de avião. Foi para
Angola porque precisava. Anseia voltar porque continua a precisar e
ficou encantado: "Sabe que na rua, digo "bom-dia" e me respondem
"obrigado"?" As pegadas continuam a caminhar.
«DN» de 2 Set 13 Etiquetas: autor convidado, F.F
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