Ah, os varandins que nos lavam os olhos!
Por Ferreira Fernandes
Ontem fui ao lançamento de um livro de crónicas de um jovem amigo, Nuno Costa Santos. Fui um dos que apresentaram o livro Vou Emigrar para o Meu País. Obriguei-me a explicar o que eu achava ser um livro de crónicas, o que eu me dispensaria se se tratasse de um livro de poesia ou de reportagens. Mas uma crónica, o que é? Opinião? Muita liberdade sobre os factos? Total liberdade, até invenção pura? Lembrei ao próprio autor que ele, numa das crónicas, dizia que inventar, tudinho, não. Ora um magnífico cronista, o brasileiro Joaquim Ferreira dos Santos, ao prefaciar As Cem Melhores Crónicas Brasileiras (uma seleção em que na correspondente em futebol nem Neymar entrava, quanto mais Fred) escrevia: em crónica "vale tudo, menos ser chato". Difícil, não é?, não ser chato quando nos sentimos obrigados a comentar o noticiário rasteiro. Um tipo vulgar, fraco e sonso, sonso, fraco e vulgar ocupa uma posição inusitada na conversa nacional, como escapar dele?
Antes de apresentar o livro, na FNAC do Chiado, eu e o Nuno estávamos numa daquelas janelas de pé-direito, com o Castelo ao fundo. Mais perto, no varandim de uma casa de prédio pombalino, um homem cortava o cabelo à mulher, casal jovem, com ela de bata, sentada numa cadeira vulgar. Ele inclinou-se para a beijar entre duas tesouradas. O livro do Nuno tem uma crónica sobre um miúdo que passou a crónica a dizer-lhe: "Eu já tenho 4 anos." De facto, com tanto para voar, por que chafurdar?
«DN» de 30 Jun 14Etiquetas: autor convidado, F.F
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