14.3.19

Brexit – masoquismo e sadomasoquismo

Por C. Barroco Esperança

É difícil a um convicto europeísta entender a obstinação do Parlamento inglês que, após a vitória do Brexit, perante claros indícios de que o resultado de um novo referendo não se repetiria, persiste na cega determinação de reduzir o Reino Unido a uma pequena Inglaterra e País de Gales, sem viabilizar uma nova consulta eleitoral.
Que interesses ou ambições pessoais oculta a renúncia a outro referendo?
Cameron, oportunista e cobarde, foi responsável pelo isolamento britânico que está em vias de consumar-se, arrastando a UE na irrelevância para que caminha o RU. Nem a senhora May nem Jeremy Corbyn desejam consultar de novo o eleitorado, numa matéria que condiciona o futuro das novas gerações de um e de outro lado do Canal da Mancha.
O Reino Unido perde grandes empresas, diminui o poder de compra dos seus cidadãos e isola-se, convencido de que é o mundo que fica separado do Império Britânico, e arrisca tornar-se mais dependente dos EUA onde a política de Trump não lhe augura segurança.
A União Europeia, por maiores que sejam as críticas que mereça, poderia sempre vir a ser o que os seus Estados quisessem, construir o modelo que desejassem e tornar-se a potência que o PIB e a população, superiores aos EUA, permitia.
A União Europeia deixa de contar com a segunda economia e as mais poderosas Forças Armadas. Numa vitória de Pirro, Boris Johnson derrotou Cameron, pois a promessa do referendo, para ganhar eleições, resultou na humilhação do último e na falta de soluções do primeiro, incapaz de medir as consequências.
O Reino Unido prefere o isolamento, e a UE perde a sua maior potência militar, a única nuclear, além da França, e a mais sólida e antiga democracia. O RU era a vacina contra a tentação autoritária do eixo franco-alemão e a deriva fascizante que regressa à Europa.
 A desilusão dos ingleses acompanhou a onda populista e radical da UE, enquanto o PPE combatia os partidos progressistas de todos os países, incluindo o Partido Trabalhista britânico, que se bateu pela permanência, com o sacrifício da sua deputada Jo Cox, símbolo da união do projeto europeu, adversária da xenofobia e da visão conservadora e monetarista da UE.
O Reino Unido arrisca a secessão da Escócia e do País de Gales e convulsões na Irlanda do Norte, enquanto a UE, com o estímulo de Trump e Putin, se expõe à desintegração de Espanha, Itália e Bélgica, com a Córsega a chantagear a França e todo o seu espaço em risco de exacerbar velhos nacionalismos e redefinir novas fronteiras.
A geografia política da Europa não é imutável nem pacífica; não é perpétua a liberdade nem vitalícia a democracia; os países também não são eternos.
A uma União Europeia fragmentada não insistirá no pedido de adesão a Turquia, é esta que há de vê-la como mais um Curdistão.
Não sei se a rejeição, ontem, do cenário de Brexit sem acordo – em qualquer momento e em qualquer circunstância –, abrirá uma janela de oportunidade para reparar o erro. Só quatro votos salvaram a votação.
Ponte Europa / Sorumbático

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