6.3.19

Fazer parte dos processados

Por Antunes Ferreira
Nunca pensara que me podia sentir frustrado em Goa – mas infelizmente estou a sentir-me. Com mil diabos que raio me havia de acontecer! Não pensem os que ainda me conseguem ler – e julgo que se ainda os houver serão muito poucos – que estou mais ou menos louco ainda que de médico e louco todos tenhamos um pouco de acordo com rifão popular bem conhecido. (Aliás em terra em que famílias católicas numerosas um filho ia para padre outro para médico…)
Então, que se passa? Pois o motivo é simples: eu também quero ser processado pelo meritíssimo Neto de Moura. E pelos vistos estando aqui a mais de oito mil quilómetros do magistrado o seu braço (leia-se da lei dele) é provável que não chegue cá. No entanto a publicação deste modesto contributo para a sanha persecutória do togado que se julga afrontado na sua honra, dignidade, honestidade, profissionalismo, competência e outras qualidades talvez baste para que, mesmo à distância me saia a sorte grande. Uma simples carta precatória…
Houve um tempo em que estive proibido de assinar textos em órgãos da comunicação social e aliás duplamente: pela PIDE/DGS e pelas autoridades militares. Era a negra época da velha senhora que já então começava a entrar na decrepitude e estávamos em 1966. Por mor dos meus “pecados” políticos e ao fim de três anos de serviço em Portugal fui mobilizado para Angola onde cumpri mais dois, tendo chegado a tenente miliciano. Embora oposicionista do regime salazarento enquanto vesti a farda do Exército Português cumpri tão bem quanto me foi possível os meus deveres militares e de cidadão.
Só que não podia escrever – o que me deixava muitíssimo cacimbado (termo retintamente angolano que se refere a cacimbo, chuva miudinha, chata…) e, como tinha ou julgava ter algum jeito para gatafunhar dediquei-me a pseudo cartuns que assinava como Rico 66 Rico 67 e por aí adiante. Isto porque houve quem me aceitasse e publicasse. Depois, voltando à normalidade já pude assinar Antunes Ferreira e voltar a ser cortado amiudadas vezes pelo lápis azul dos censores normalmente mais estúpidos do que um triângulo obtuso.
Ora bem hoje se a tal me ousasse ser-me-ia fácil caracterizar o juiz Neto de Moura recorrendo à Pré-História. Desenhá-lo-ia como um homo sapiens (???) arrastando puxando-a pelos cabelos uma qualquer mulher, uma fêmea que se a dar-se ao luxo de recalcitrar a outro macho já trazia os dois braços e uma perna partidos. Para aqueles que defendem que a História não se repete aqui deixo esta sugestão a quem saiba desenhar. Talvez com ela e ainda que a mais de oito mil quilómetros de distância do meritíssimo Neto de Moura eu consiga ter a taluda do Carnaval: fazer parte dos processados.

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1 Comments:

Blogger José Batista said...

Uma rica peça, esse Neto de Moura.
Mas a mim parece-me que o mal é muito mais geral. E por isso, desde há muito (ou seja, desde que me conheço), penso que Portugal é mais um estado «de torto» do que um estado de direito.
E essa é uma das razões principais porque a condição sócio-económica do país é cronicamente tão precária.

7 de março de 2019 às 22:43  

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