19.4.23

Indira Gandhi em pessoa *Uma entrevista em exclusivo e especial

Por Antunes Ferreira

A entrevista que fiz a Indira Gandhi teve dois momentos especiais e para mim realmente significativos. Ao longo de quase uma hora e a bordo de um avião abordámos muitos aspectos da vida da chefe do Governo da Índia e, naturalmente do próprio país que era considerado a maior democracia do Mundo. Toda a conversa foi muito interessante e a política respondeu a todas as perguntas que lhe coloquei – o que, dada a minha larga experiência nesse campo foi realmente impressionante.

E porquê o avião? Pois muito simplesmente a data marcada para a conversa sofrera um percalço: fora a própria Indira que me telefonara para a embaixada portuguesa para me dizer que tinha de cancelar a entrevista pois ia deslocar-se a Allahabad a cidade natal da família Nerhu onde ia assistir ao funeral dum primo muito chegado.

Ora eu tinha vindo de Lisboa com tudo programado para a entrevista e por isso sugeri-lhe que a poderia acompanhar no avião em que ela se deslocaria e nele fazer a entrevista. Um tanto reticente ao inicio ela acabou por aceitar a proposta, mas o problema é que tinha uma agenda preenchidíssima   e por isso fez-me uma contraproposta. Eu poderia dar uma volta pela gigantesca índia  a fim de colher impressões que poderia utilizar na entrevista. 

Aceitei depois de lhe ter dito que ia obter o aval do “Diário de Notícias” a quem ia apresentar a sugestão, que face ao  interesse da entrevista e o seu exclusivo para Portugal, me deu carta branca para o empreendimento. Sendo assim fui posto em contacto com a Directora Geral do Turismo que me atribuiu um intérprete, um goês radicado na Índia, o senhor Francisco (Francis) Xavier de Menezes que falava perfeitamente português e que acompanharia no périplo.

Fomos a diversos Estados  dos quais destaco o Bihar  onde visitei Bodh Gaya ou Bodhgaya que é uma cidade do distrito de Gaya, no estado de Bihar, na Índia. Está localizada a 96 quilômetros da capital do estado, Patna. Historicamente, era conhecida como Bodhimanda. O principal mosteiroo de Bodhgaya era chamado Bodhimanda-vihara. É o local mais sagrado do budismo, pois teria sido o local onde o fundador da religião, Sidarta Gautama, teria criado a doutrina, por volta do século V a.C. A localidade tem muitos templos erigidos por diversos países onde o budismo é praticado com maior ou menor importância.

E nela que existe a chamada árvore da vida sob a qual Gautama terá meditado durante 59 dias e 59 noites findos os quais saiu a divulgar a nova religião. A árvores que me garantiram ser a “descendente da original é decorada com muitos fios de diversas cores e é chamada a Árvore da Vida. É considerada sagrada e as suas folhas são oferecidas a visitantes ilustres. Dada a minha qualidade de futuro entrevistador de primeira-ministra tive direito a receber uma…

També passei pelo estado de Orisssa tendo ficado dois dias na capital  Bhubaneswar onde visitei um templo decorado com as paredes decoradas em altos relevos de cenas de amor sexual explícitas e assistir a um espectáculo de danças; as mulheres de Orissa são consideradas as mais belas da Índia. Seguimos depois Calcutá onde fiquei apenas uma noite e pouco vida cidade que muito gostaria de ver os bairros de lata onde a Madre Teresa exercia a sua missão.

Mas o tempo era curto e por isso fomos de avião até Caxemira onde tive a oportunidade de ficar numa houseboat no lago Lago  Dal e fazer uma viagem de ordem militar a Gulmarg no sopé do Himalaia. De resto Srinagar, a capital de Caxemira era praticamente um quartel tantas eram as unidades do exército indiano ali estacionadas. Do outro lado da fronteira fortemente guardada o poder das armas paquistanesas era aparentemente igual. Mas em verdade tenho de dizer que ali não me foi permitido deslocar.

Finalmente de volta a Nova Deli tomei enfim o avião onde iria entrevistar Indira Gandhi. A aeronave era dividida em duas partes: na frente iam as pessoas que integravam a comitiva da primeira-ministra e a segunda, atrás encontrava-se Indira o Seu filho Rajiv e a mulher deste Sónia. 

Fiquei sentado ao lado dum sique, o chefe da segurança  da primeira-ministra e logo ali o meu espanto: ele provava a comida e a bebida antes de ambas serem levadas para Indira e os seus acompanhantes lá atrás comer. Mal sabia eu, para além da admiração inicial que tempos depois seria ele que dispararia os primeiros tiros que matariam Indira. Foi este o primeiro momento que achei realmente especial.

Quando me indicaram que me deslocaria à zona onde Indira se encontrava ia um tanto de pé atrás. Era conhecida a má relação que tinha com a comunicação social. Mas tudo se modificou com a conversa que tivemos de cerca de uma hora. Logo de começo ela disse-me que sabia que eu era mais fluente em francês e nessa língua decorreria a entrevista.

Abordei os temas mais diversos a que ela respondeu com toda a franqueza. Só houve um momento mais difícil quando abordei a morte do seu filho primogénito Sanjey num desastre de planador. Como visse que o assunto a incomodava mudei rapidamente o rumo das perguntas. Finda a entrevista ela apresentou-me o filho e a nora. Rajiv ficou muito interessado ao saber que a minha mulher era goesa e trabalha na companhia aérea portuguesa.

Disse-me que na verdade era um piloto de avião e só a morte do irmão o atirara para a política. E de tal firma se estabeleceu uma corrente de empatia que me convidou a jantar com ele e a sua mulher nessa noite pois no dia seguinte eu regressaria a Portugal, o que aceitei naturalmente.

Regressado ao meu lugar momentos depois foram-me dizer que a primeira-ministra ainda me quera falar. Tratava-se de uma sugestão. Por certo que não estaria interessado em assistir a um funeral. Por isso propunha-me que durante durassem as exéquias poderia visitar as casas daa família Nerhu Anand BhavanPara tal o seu secretário pessoal Vijay Sicrit aguardar-me-ia à saída do avião com uma viatura,

Foi aí que aconteceu o segundo momento extraordinário. À chegada da chefe do Governo estava formada na pista uma força militar á qual ela passou revista acompanhada pelo comandante da mesma. Depois retirou-se. Eu fora o último a desembarcar e aguardava a chegada da viatura que me havia de levar. A força militar, provavelmente um batalhão fizera direita volver e o comandante ao ver-me no meu fato europeu e de pasta mão deve ter pensado que eu era um convidado muito especial. E marcialmente deu a ordem de olhar à direita enquanto me fazia a continência. Meio envergonhado fiz um gesto com a mão em jeito de resposta. Entretanto chegar o carro com o senhor Sicrit. E lá fomos conhecer as casas seculares da família Nehru.

Como no avião não tinha havido fotógrafo foi na casa oficial do Governo que após um largo tempo de espera e alguma irritação da senhora lá apareceu um jovem muito assustado poi nunca estiver tão perto da primeira-ministra. Enfim lá se fizeram as fotos que nessa noite, durante o jantar com Rajiv e Sónia me foram entregues. Foi a última ocasião duma entrevista muito especial exclusiva pois no dia seguinte regressei a Portugal e ao “Diário de Notícias” onde naturalmente tive honras de primeira página.  

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