17.1.22

No "Correio de Lagos" de Dezembro de 2021

  


«Queimar combustíveis fósseis é como partir a mobília para alimentar a lareira, por ser mais fácil do que ir buscar lenha»  Theodore Roosevelt

«A partir de agora, 50% dos carros comprados pelo Estado serão eléctricos» – Matos Fernandes, Ministro do Ambiente, em Fevereiro de 2019.

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SUPONHO que, desde que há jornais, todos têm de reserva uns quantos textos a que podem recorrer para preencher inesperados espaços em branco — e nem precisam de ser plausíveis, dado que, após terem cumprido a sua função, esperam que nunca mais ninguém se lembre deles; mas não foi isso que sucedeu comigo, na rábula que passo a contar: 

Segundo uma dessas “notícias”, num certo aeroporto internacional houve um brincalhão que, acedendo à instalação sonora sabe-se lá por que artes, informou os passageiros de que um determinado voo partiria com atraso, a menos que alguém pudesse emprestar... um ELÁSTICO!  Acredito que devo ser a única pessoa, das muitas que leram a “notícia”, que ainda se lembra dela, mas isso sucede porque, no dia 30 de Julho de 1976, também eu me vi na situação embaraçosa de depender de um ELÁSTICO para que corresse bem um acto importante da minha vida — nada menos do que o meu casamento! E foi assim:


TRÊS ANOS antes, na sequência da guerra israelo-árabe, os países que tinham apoiado Telavive foram sujeitos, por parte dos produtores de petróleo da região, a um boicote que implicou, além de uma dramática escassez de combustíveis, limitações no fornecimento de energia eléctrica, pelo que, pelo menos em Lisboa (onde eu morava), toda a electricidade era cortada durante duas horas por dia e, TRÊS ANOS DEPOIS, ainda a situação se mantinha! Portanto, quando, a meio da tarde do tal 30 de Julho, eu esperava os convidados e o notário que haviam de acorrer a minha casa (onde iria decorrer a cerimónia), lembrei-me de que os elevadores não funcionariam, a campainha da porta também não, e nem se poderia contar com o trinco eléctrico para abrir, à distância, a da rua. E foi por isso que, ao mesmo tempo que me lembrava da história que atrás contei, dei por mim em busca de um ELÁSTICO para poder encravar o mecanismo da porta do prédio!

 

EM TERMOS mais gerais, seria de supor que, perante esse choque petrolífero, o nosso mundo, viciado nos hidrocarbonetos, fizesse qualquer coisa para contrariar essa dependência. Mas não, e de vez em quando apenas acorda com sobressaltos como greves de camionistas ou, como há pouco sucedeu, com o fecho do gasoduto que trazia gás natural da Argélia para a Península Ibérica, passando por Marrocos, ou com a ameaça da Bielorrússia de “fechar a torneira” do que passa no seu território.

 

ENTRETANTO, decorreu recentemente, em Glasgow, uma importante reunião internacional para debater as “alterações climáticas” (na qual, obviamente, a ÁGUA e os COMBUSTÍVEIS FÓSSEIS foram as “estrelas”), onde marcaram presença Joe Biden, António Guterres, Boris Johnson, a Família Real britânica... e por aí fora, enquanto “marcaram AUSÊNCIA” Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa (de um país que se queixa de vir a ficar debaixo de água com a fusão dos gelos da Antártida!), tendo ambos preferido pôr em prática o “Think globally, act locally” que é como quem diz «Preocupa-te com o mundo, mas trata da tua terrinha».

Ora, pensando bem, até foi melhor assim, pois corriam o risco de que alguém, conhecendo a nossa realidade, lhes lançasse em cara que há, por cá, quem gaste dinheiro público em carros de combustão; que destrua, à dúzias de cada vez, essas “máquinas de descarbonizar” chamadas “árvores”; que deixe candeeiros de iluminação pública acesos durante o dia e — cereja em cima do bolo — que use água potável para alimentar lagos e repuxos, lavar carros, encher piscinas e autoclismos — nem sequer hesitando em regar extensos relvados em dias de chuva (!!), usando água que não raro se encaminha directamente para as sarjetas! — tudo isso (e muito mais) numa orgia de desperdício que nos devia envergonhar a todos. Portanto, fizeram esses governantes muito bem em seguir o conselho da minha avó: «Se é para fazeres tristes figuras, deixa-te ficar em casa».

 

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