15.1.06

Ouvindo as estrelas...

Óleo em madeira da autoria de Avelino Cunhal
A MEMÓRIA é uma coisa extraordinária! Sons, imagens, sabores... enfim, sensações e factos remotos de que já não nos lembrávamos podem vir de repente ao de cima por causa de uma pequena coisa.

E passo a explicar porque é que o digo:

Em tempos que já lá vão, era frequente contarem-nos (ou darem-nos a ler) histórias edificantes cuja função principal era moldar o nosso carácter e sensibilidade. E uma delas era a de um aleijadinho que andava a pedir, de porta-em-porta, tocando flauta.
Sucedia, no entanto, que ele o fazia tão mal e tão alto que, em vez de ser uma alegria para os ouvidos de quem lhe poderia dar esmola era, pelo contrário, um sofrimento para os tímpanos; mas, como é natural, ninguém lho dizia.
Ora, a certa altura da história, uma senhora, ao vê-lo aproximar-se da sua janela, chama o filho e diz-lhe:
- Toma lá esta moeda e vai dá-la ao homem. E diz-lhe que é para não tocar, pois já nem o posso ouvir! Ele é que nos havia de pagar a nós!

A criancinha, ainda desconhecedora das realidades da vida, assim fazia - e dava a esmola ao aleijadinho com a condição, precisamente, de que não tocasse nada.

E o conto terminava com o pedinte a derramar lágrimas em catadupa e, se a história fosse bem contada, os leitores e ouvintes não ficavam atrás da personagem em matéria de choradeira.
Pois tenho agora de confessar que esta pequena história, que estava profundamente enterrada nas catacumbas da minha memória, veio à superfície quando li a notícia, no «Expresso-online», da existência de um número de telefone para onde podemos ligar e ouvir os candidatos à Presidência da República... em chamadas de valor acrescentado!

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

De facto, quando li a notícia pensei cá para os meus botões: mas haverá alguém tão parvo que ainda vá pagar para ouvir os candidatos a PR?
Já não chega a dose diária?

E ainda sobre estas chamadas de valor acrescentado: haverá tb alguém que telefone para saber a programação das tv's?

Enfim, grandes mistérios !

Rui Esteves
Porto.

15 de janeiro de 2006 às 19:22  

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