Acontece...
Deve um honrado banco português
ensinar a falar alemão?
ensinar a falar alemão?
O GOVERNO português anda a pagar bom dinheiro, na Alemanha, para que uns autocarros vistosos percorram as ruas de várias cidades, nas vésperas do Mundial, fazendo promoção das delícias do nosso turismo. Em Portugal o banco BPI investe numa intensa campanha de crédito automóvel, fazendo passar nas rádios uma conversa bacoca entre amigos que querem ir de carro à Alemanha assistir aos jogos do Campeonato. Num e noutro casos o futebol é o motivo e a criatividade publicitária é a ferramenta. No primeiro, parece-me tudo muito bem. No segundo, muito mal.
Admito que o pecado sempre me seduziu. Como sou jornalista profissional e convicto, está-me vedado fazer publicidade, ou sequer desejá-la de longe. Apesar disso, a verdade é que aquele mundo apetece-me desde os meus verdes anos de estudante, quando por lá andei pela mão de um velho e grande senhor publicitário chamado Luís Lagrifa, na sua agência DC 3. Mas pronto: para um jornalista escrever publicidade é pecado muito feio. E, no entanto, eu juro que gostava de tentar escrever quatro palavras certinhas e deixar meio mundo louco com o meu achado, criar uma figura adorável e levar o povo atrás dela a comprar tudo o que ela comprasse, inventar um mote irresistível e pôr o país a repeti-lo de manhã à noite. Só que não posso!
É por isso que ouvi com atenção o tal “spot” do BPI. Tinha lá tudo para me atrair: a actualidade do futebol e uma estranha criatividade publicitária. Óptimo!
Ora nesse anúncio, alturas tantas, há um que berra “Guten Tag!”, o que em alemão quer dizer bom dia. Mas que logo uma voz traduz por boa tarde. E o anúncio continua em grande alegria. A seguir querem dizer “adeus” em alemão e há uma voz que grita “ Auf Wieder ZIN!!!!” o que é uma asneira porque em alemão diz-se “Auf WiederSEHN”. E isto bem sonante: ZIN em vez de ZEN. Tudo numa boa, estão a ver? À nossa maneira, é como se BeLÉM fosse BeLIN. Tudo numa boa, estão a ver? Nem lhes valeu a memória daquela música do José Cid onde ele canta “adio, adiós, auf wiedersehn (correctamente), good bye.”
Então vejamos: juntar patacoadas num “spot” para ser ouvido dezenas de vezes por dia, foi coisa intencional. A ideia talvez fosse encenar uma conversa de bravos portugas que não percebem um chavo de língua alemã e daí o chorrilho de erros. Sim senhor. Mas tenho as maiores dúvidas de que um “spot” baseado em atropelos linguísticos (nunca enunciados como atropelos e portanto nunca emendados) seja um bom serviço prestado ao prestígio da publicidade e ao enriquecimento cultural de quem a consome. Ora, aparentemente, o BPI não teve dúvidas destas, gostou, aprovou e pagou. Achará que é bom ver o seu nome a embrulhar coisas destas.
Ora é aqui que entra a minha frustrada costela de criativo publicitário. Ah! Se eu pudesse! Se eu pudesse esticar um poucochinho este “spot”, e já que é lícito construir publicidade na lógica do erro assumido, então o dito “spot” terminaria assim: “Esqueça este anúncio! Um banco não ensina línguas!”
Ripa na Rapaqueca Mar 2006
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