O «homem médio» (*)
ADOLPHE Quételet, o cientista belga de quem falámos na semana passada a propósito das chuvas de estrelas, foi um homem curioso. Começou por ser professor de matemática, área em que se doutorou com uma tese sobre geometria. Foi secretário vitalício da Academia Real de ciências belgas e começou a fazer estudos demográficos em 1828. Fundou em Bruxelas os primeiros serviços governamentais de estatística do mundo e aí criou igualmente o Observatório Astronómico, de que foi director. Estudou meteorologia, sociologia e estatística.
E foi nesta última área que deixou contribuições mais duradouras. Abordava a ciência do ponto de vista da incerteza. Trouxe essa perspectiva para os estudos sociais, notando que existia uma regularidade estatística por detrás da aleatoriedade. Criou o conceito de «homem médio», que tantas polémicas haveria de desencadear, tanto em probabilidades como em sociologia. Quételet reparou que as populações humanas se distribuem com estranha regularidade. Notou por exemplo que, para cada desvio percentual, há uma fracção bastante regular de pessoas que se desviam à média. E que isso acontece tanto no peso como na altura, como nas doenças, como nos anos de vida e noutras características humanas. E reparou que as características das pessoas seguiam habitualmente uma distribuição que hoje se chama normal ou de Gauss.
Foi a primeira vez que essa distribuição foi usada para caracterizar populações e não apenas erros de medida. O seu «homem médio» é certamente uma abstracção. Não é um homem de carne e osso. Mas é uma abstracção que permite caracterizar populações, desde que se tenha em conta tanto a média como os desvios à média. É isso que é espantoso, não que haja irregularidades.
(*) Adaptado do EXPRESSO
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