27.11.07

O palito

Por Nuno Crato
NÃO DEVE HAVER OBJECTO MAIS SIMPLES nem manufactura aparentemente mais banal. Apenas usa uma matéria prima, vende-se sem manual de instruções, não necessita de montagem nem de manutenção. Mas tem uma história longa e fascinante.
Antepassados dos modernos palitos eram usados pelos Egípcios, Gregos e Romanos, que se serviam de lascas de madeira para limpar os dentes e faziam palitos de metal que incorporavam na joalharia da época.
O naturalista Plínio o Antigo e outros sábios da Antiguidade discutiam as vantagens dos diversos tipos de madeira. E o poeta romano Martialis ridicularizava em verso os desdentados que se passeavam na rua com inúteis palitos na boca, apenas para disfarçar a sua decrepitude.
No Renascimento usavam-se penas de ganso. Durante a revolução industrial desenvolveram-se processos de corte de madeira e fizeram-se grandes progressos na indústria. Usaram-se as técnicas mais modernas e estudaram-se matematicamente os melhores processos de aparo. Fizeram-se cortes triangulares e desenharam-se palitos em forma de tetraedro alongado.
Ainda antes das técnicas matemáticas de optimização de corte, maximizava-se a resistência e minimizava-se o desperdício.
Um dos países que mais se destacaram no negócio foi Portugal, que servia de exemplo aos próprios Estados Unidos (Petroski, «The Toothpick», Knopf, 2007).
Em 1817, tentando convencer os ainda recalcitrantes críticos da industrialização, a Sociedade Americana para Promoção da Manufactura recordava o exemplo da indústria de palitos do Lorvão, perto de Coimbra: «Será que as indústrias degradam Portugal?», perguntava. «Será que a manufactura de palitos é feita na Universidade de Coimbra?»
«Passeio Aleatório» - «Expresso» de 24 de Novembro de 2007

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