11.3.08

Estatísticas

Por Nuno Crato
O POLÍTICO INGLÊS BENJAMIN DISRAELI gostava de dizer que «há três tipos de mentiras: mentiras, mentiras horríveis e estatísticas».
Quando se diz, por exemplo, que os alunos obtiveram melhores resultados, fica-se sem saber se o mesmo aconteceu porque os jovens aprenderam mais ou porque os exames foram mais fáceis. A falácia pode ser grande, mas pelo simples facto de se mostrarem números muita gente acredita nela, ou está mais propensa a nela acreditar. O engodo resulta do uso dos números, claro, e não deles próprios.
Pelo contrário, é importante aprender um pouco de estatística para poder ser crítico na análise. Inspirado nesta ideia, o escritor norte-americano Darrell Huff escreveu em 1954 aquele que se viria a tornar o livro sobre estatística mais vendido de sempre. Chama-se «How to Lie with Statistics» e está repleto de exemplos de «como se pode mentir com estatísticas». Foi sucessivamente reimpresso e continua à venda.
Sem querer ser um herdeiro dessa obra, um livro mais recente, de Jean de Kervasdoué, intitulado «Les prêcheurs de l’apocalypse» (Plon, 2007), mostra como alguns modernos «pregadores do apocalipse» usam estatísticas enganosas em temas ecológicos e de saúde.
Um dos exemplos mais interessantes (p. 89), embora macabro, é o do número de mortes por cancro em França, que subiu de 15,5% entre 1980 e 2000. Parece um número brutal, que lança um alarme sobre o ambiente e o estilo de vida modernos. No entanto, entrando em conta com o crescimento da população (10,3%) e o seu envelhecimento (18,8%), verifica-se que o risco de morte por cancro se reduziu em 13,6%. Tal como o fracasso se pode esconder com estatísticas, também o progresso pode ser negado com estatísticas enganosas.
«Passeio Aleatório» - «Expresso» de 8 Mar 08

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6 Comments:

Blogger Rui Baptista said...

É atribuido ao Prof. Leite Pinto, antigo ministro de Salazar, o seguinte conceito sobre estatística: "Há duas maneiras de mentir: uma é não dizer a verdade; outra, fazer estatística".

Pode dizer-se estarmos em presença de um conceito economicista ao reduzir os 3 tipos de mentiras de Disraelli a dois.

O artigo do Prof. Nuno Crato, sem pôr em causa o valor da estatística, chama-nos a atenção para estatísticas enganosas detectando os erros em que algumas incorrem.

Segundo julgo depreender, o mal não está na estatística, mas no mau uso que dela se faça com fins políticos ou quaisquer outros menos desejáveis.

11 de março de 2008 às 10:47  
Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

Rui Baptista,

E há casos piores.
Como espero contar em breve (e pelos motivos que se imagin), deixei de comunicar às autoridades os assaltos de que fui vítima.

Suponho que, nas estatísticas, isso deve aparecer como "diminuição da criminalidade".

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Noutros casos, joga-se com factos como:

«A grandeza em causa aumentou, mas o ritmo de aumento diminuiu» (passa-se da '1ª derivada da função para a 2ª); ou «Diminuiu, mas comparando com o mesmo mês do ano anterior aumentou», etc.

11 de março de 2008 às 11:22  
Blogger Anti said...

Vamos então para uma antecipação de uma mentira, perdão, estatística:

Os resultados do exames nacionais, sobretudo ao nível do 9ºano, irão melhorar este ano, mas sobretudo para o próximo ano lectivo...

11 de março de 2008 às 14:10  
Blogger Blondewithaphd said...

Sim, subscrevo o ponto de vista e como tenho trabalhado (muito) em Disraeli e porque há certas semelhanças na mentira estatística como na mentira cartográfica aqui deixo a indicação de "How to Lie with Maps", Marc Momnomier. Está tudo na interpretação!

11 de março de 2008 às 19:12  
Blogger pedro oliveira said...

Muitos parabéns Professor Nuno Crato!

Nuno Crato é um dos premiados do European Science Awards:
http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1322359&idCanal=13


vilaforte

12 de março de 2008 às 16:27  
Blogger P.oliveira said...

Muitos parabéns Professor.um abraço de toda a equipa do http://vilaforte.blog.com

12 de março de 2008 às 16:38  

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