13.12.10

Os ralhos do Pai do Céu

Por A. M. Galopim de Carvalho

QUANDO o tempo escurecia e ficava com «ares de trovoada», ou quando, distantes ainda, se abriam os clarões dos relâmpagos ou se ouvia o ribombar longínquo e arrastado dos trovões, a minha avó entrava em grande e angustiada agitação. Já não parava quieta, fechando portas e janelas, correndo cortinados, dizendo baixinho:

– Está a ralhar o Pai do Céu! Valha-nos Santa Bárbara! Valha-nos São Jerónimo!

E rezava, nervosa, bichanando em surdina, percorrendo a casa, de mãos junto à boca, com os dedos entrelaçados e crispados, persignando-se apressadamente a cada relâmpago e a cada estrondo.

- «São Jerónimo se alevantou, seu sapatinho calçou»... (...)
Texto integral [aqui]

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1 Comments:

Blogger Bartolomeu said...

Belas recordações, nos traz o Professor Galopim de Carvalho.
Mas, não andaria a sua santa avó, muito longe da verdade, tanto quanto muitas outras almas nessa época que aproveitávam o susto que o ribombar lhes pregava, para pensarem um pouco nas maldades que cometiam - inocentes relativamente às de hoje - e fazer o seu acto de contrição, ou de expiação, coisa que nos nossos dias caíu completamente em desuso, e bastante falta faz a muito boa gente.
Lembro-me de assistir a trovoadas de verão, na varanda da casa da minha avó, ainda criança, mas absolutamente fascinado pelo espectáculo de ver o seu riscar-se de alto a baixo por um feixe extasiante de luz e logo em seguida, o estrondo que ecoava pelas quebradas da serra. E a minha avó, muito aflita, sussurrando preces e tentando convencer-me a entrar em casa, mas sem se atrver a vir à varanda, buscar-me.
Bons tempos, caro Professor... hoje, já nem as trovoadas são o que foram...

13 de dezembro de 2010 às 15:09  

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