8.12.13

Afinal ele era muito popular

Por Ferreira Fernandes
Mandela é tanta coisa, de santo universal a arma de arremesso num país longínquo... É tempo, talvez, de ir ao osso. Quis Mandela, e tudo o mais decorreu disso, que os homens fossem iguais. Olhando para trás, não é coisa pouca, eram raros os adeptos. 
Conheci Mandela no primeiro domingo de abril de 1961, em Luanda, tinha eu 12 anos. Nessa tarde, um rapazito negro, o Silvestre, com quem eu jogava bola, foi morto na estrada da Cuca por colonos. Ao saber da morte, puxei a pala do boné para os olhos e vi Mandela, embora sem ainda lhe conhecer o sorriso e o nome. Anos depois, tinha eu 18, já lhe conhecia o nome, e ia ao Seminário de Luanda, para falar a rapazes da minha idade, exilados na capital, vindos de Cabinda e Malanje. Eles negros católicos, eu branco incréu, falávamos da fé que nos unia (com mandamento único: os homens são únicos). Uma velha senhora que vive hoje em Lisboa, a D. Maria Antónia, fazia bolos que o filho dela e eu, um negro e um branco, íamos levar às prisões onde estavam homens fiéis à supracitada crença. Julgo lembrar-me de que havia poucas donas Marias Antónias. E nós, jovens que na véspera da visita de Marcelo Caetano a Luanda, em 1969, distribuíam panfletos que repetiam a tal igualdade, também não éramos muitos. Por essa altura, disseram-me: "Vai e defende que os homens não são iguais." Não fui, como me disse Mandela. Tive sempre a estranha sensação de que poucos o conheciam. Hoje vejo que não. Ainda bem
«DN» de 8 Dez 13

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