21.12.13

«Dito & Feito»

Por José António Lima
No momento em que se celebra a grandeza da figura política de Nelson Mandela, a esquerda portuguesa não resistiu à tentação de utilizar demagogicamente a morte do líder sul-africano como arma de arremesso em mesquinhos ajustes de contas caseiros.
No Parlamento, o PCP, pela voz de António Filipe, apareceu a acusar Cavaco Silva de ter votado na ONU, em 1987 (quando era primeiro-ministro), contra uma resolução que exigia ao regime do apartheid a libertação incondicional de Mandela. Helena Pinto, do Bloco, apressou-se a acrescentar que “em 1987 Portugal estava do lado errado”. E foi quanto bastou para o tema alastrar em indignadas proclamações nas redes sociais e nalgumas rádios e televisões.
Acontece que, nessa ocasião, Portugal votou a favor uma resolução da ONU pela “eliminação do apartheid” e que pedia “a libertação imediata e incondicional de Nelson Mandela e de todos os outros presos políticos”. Apenas votou contra um outro documento que incitava à violência para derrubar o regime sul-africano. Recorde-se que, nessa altura, em 1987, as ex-colónias portuguesas vizinhas da África do Sul, Angola e Moçambique, estavam mergulhadas em violentas e intermináveis guerras civis.
Mandela conseguiu, também, essa proeza em que quase ninguém acreditava: substituir o mais odiado regime colonialista de segregação racial, o do apartheid, por uma democracia e em paz - sem mergulhar a África do Sul num banho de sangue, sem provocar a debandada em massa dos brancos como acontecera em todas as ex-colónias africanas, sem desencadear incontroláveis confrontos tribais e partidários pelo poder.
Mandela foi um exemplo único de luta pela liberdade, pela reconciliação, pela dignidade humana e pela convivência multirracial. Tornou-se o mais inspirador dos líderes da política contemporânea. Era, por isso, a figura mais admirada em todo o mundo, da América à China, da África ao Japão - por todas as raças, todas as religiões e todos os regimes. “Um gigante da História”, na feliz definição de Obama. Em Portugal, a esquerda do PCP e do Bloco quis reduzir essa dimensão de Mandela à pequenez das baixas querelas partidárias. Sem pudor. E sem sucesso. 
«SOL» de 13 Dez 13

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