Pátria: lugar de desventura
Por Baptista-Bastos
"Acabou a recessão!", exclamaram, cheios de alegria e tolejo, jornais,
rádios e televisões. Ninguém explicou nada a ninguém, e o bulício de
regozijo pegou-se. Nos corredores dos ministérios, nas farmácias, nos
quartéis, no edifício majestoso onde funciona a Galp, no bloco
operatório de Os Lusíadas, o murmúrio adquiriu formas de clamor: "Acabou
a recessão!" E Paulo Portas, que gosta de dizer coisas, falou e disse,
entre enlevado e libidinoso: "Vai começar um novo ciclo!", sorriu e
caminhou, lépido, para o gabinete onde congemina.
Para quem acabou
a recessão?, e quais os benefícios que traz ao milhão de desempregados;
aos milhares de famílias que recorrem ao Banco Alimentar e à Cáritas
para comer; aos reformados e pensionistas, esbulhados dos magríssimos
proventos; aos 25 mil casais sem emprego; aos milhares de miúdos que vão
para a escola com o estômago vazio; aos cem mil jovens portugueses que
abandonaram a pátria porque a pátria é lugar de infortúnio; aos velhos
que morrem sozinhos sem ninguém dar por isso, ou espantados de medo nos
caixotes de vivos para aonde são enviados por quem os não quer - para
quem e para quê?
A recessão acabou, e então? E acabou mesmo? Ou
não será outra das "incongruências problemáticas" de um Governo
mentiroso, servo dos mais poderosos e notoriamente incapaz de resolver
os nossos problemas mais ínfimos? Ninguém esclarece nada a ninguém. E o
directo concorrente ao poder, pela interposta pessoa do triste e
melancólico António José Seguro, perde-se nas banalidades do costume,
com o bordão já famoso de o PS ser "um partido responsável", afirmação
que os factos procedentes da sua direcção desmentem e enxovalham.
Poderia
ser uma ópera-bufa se o assunto fosse para rir. Mas não é. Trata-se da
nossa própria existência como nação, e o desassossego chegou a tal ponto
que muitos elementos do próprio PSD já chegam a exigir a substituição
de Seguro! Que venha outra coisa porque "isto" não é coisa nenhuma.
Dizem.
Aliás, as sondagens são inquietantes. É modestíssima a
vantagem do PS sobre o PSD, e a agitação naquele partido, cuja tradição
de conspiração interna é conhecida, avoluma-se cada dia que passa. O
espectáculo mediático protagonizado pelo secretário-geral dos
socialistas, chega a ser pungente pela tibieza do seu conjunto e pela
inexistência de fibra. Toda a gente já percebeu que o homem não serve,
que não sabe, e que simplifica sempre, por inépcia, as respostas que se
lhe exigem.
Esta historieta do fim da recessão vem auxiliar,
ainda mais, o jogo de indefinições com o qual o chefe do PSD gosta de se
enredar para melhor servir os seus objectivos, que não são inocentes:
marcados fortemente pela ideologia que defende e executa como paladino e
crente. Porque, na verdade, Pedro Passos Coelho tem, ama e serve uma
ideologia. Quanto a António José Seguro?
«DN» de 11 Dez 13 Etiquetas: BB
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