10.5.23

Maternidade em Luanda - *O bebé ainda não estava pronto

 Este testico…, texticulo é sobre a minha família

E só o publico porque lhe acho graça. 

Os tempos eram outros, as mentalidades

 Também não afinavam pelo actual diapasão.

Enfim ele aqui fica.

 Espero que não me batam…

Por Antunes Ferreira

Controvérsia em família moderada. Já tínhamos dois rebentos, o Miguel e Paulo, putos de quatro e quase dois anos, nascidos em Lisboa na Clínica de São Miguel do Professor Doutor Castro Caldas por recomendação do primo da Raquel o goês também Professor Mário Cordeiro e tudo tinha corrido sobre esferas.

Agora em Luanda de novo gravidíssima reuniram-se em nossa (alugada) casa as minhas cunhadas e o meu cunhado Mário (o Luís e a Maria Alice estudavam em Lisboa) para discutir o nome  da menina que iria nascer. O único discordante era eu: estava absolutamente convencido que viria mis um moço – o que motivava enérgicos protestos e recriminações da distinta assembleia. A esta só faltavam os auspícios dos deuses romanos familiares os Larae familiriae.

Para que não me acusem de partidarismo ou de ocultação de dados que poderiam levar à conclusão de que estava a favorecer a minha posição faço já uma chamada de atenção bipartida. Primeiro: os meus sogros estavam em Moçâmedes onde como funcionário das Alfândegas Ultramarinas fora colocado como director respeitando o Estado a sua posição em Goa e o casal tinha levado consigo a fila mais nova Belinha.

Segundo: os árduos defensores da feminilidade da nascitura (???) tinham apoios substanciais à tese deles. Veja-se, A minha mãe, que morava num apartamento na avenida dos Combatentes, tinha um “truque” consistindo numa fórmula misteriosa em que entrava a idade da grávida, a data da concepção (mais ou menos) e mais uns pozinhos; tudo conjugado: tiro e queda – uma menina.

A nossa lavadeira Miquelina (mais preta – como então e dizia – não podia ser) invocando um quimbanda que estava em contacto espiritual com um santo semelhante do Brasil pusera-lhe a questão e obtivera umas rezas para o efeito. Resultado: uma moça fora de quaisquer dúvidas. O Ju, meu irmão mis novo, caçador de fim-de-semana na mata, até atirando a elefante recebera do camarada com quem ia atirar outra certeza baseada não sabia em que conhecimento; mas lá que era uma donzela, jurava p’las cinco chagas de Cristo! 

E quanto ao nome a pôr na pia baptismal? Aí era o busílis. Na moda estavam as Tânias, as Vanessas, as Matildes e claro havia que ter em conta a tradição raqueliana. Portanto, Tânia Raquel, Vanessa Raquel, até uma Raquel Clotilde saiu a terreiro. Eu – mudo e quedo. Vendo-me assim, insistiram em ouvir a minha opinião. “Já que a querem saber, a menina vai chamar-se… Luís Carlos; Luís por parte do to, vosso irmão e Carlos porque é o nome do vosso Pai.”

Foi uma algazarra. Que porque sim, que porque assado. Cada um regressou às suas casas e os dias foram passando até que rebentaram as águas pela madrugada e levei a minha mulher à maternidade de Luanda. Nesse mesmo dia à tarde meti o Miguel e o Paulo no Colt e fui ver como paravam as coisas. Deixei-os no carro, subi e fui encontrar a minha cara-metade muito chateada pois ainda não nascera o bebé e as condições eram péssimas. “Que saudades da Clínica de São Miguel…”

Desci e quando entrei no Colt perguntou-me o Miguel “Ó pai então o mano não vem?” E o Paulo, sabichão: “Não vês que ele ainda não estava pronto!

Da cara do meu cunhado Mário de onde da sua casa telefonei para Moçâmedes à minha sogra informando-a de que tinha mais um neto que se chamaria Luís Carlos foi de tal modo que justificará outro escrito. Mas tenho de acrescentar que o Mário se tornou o maior amigo do sobrinho que desejara que fosse sobrinha e que na devida altura ainda não estava pronto…      

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1 Comments:

Blogger Dulce Oliveira said...

Essa história é muito bonita. Eu tive uma grande desilusão quando nasceu a primeira sobrinha que segundo todas as previsões seria um rapaz.

11 de maio de 2023 às 19:24  

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