17.4.06

Passeio Aleatório (*)

Desafios da matemática

NAS FINAIS das Olimpíadas Portuguesas de Matemática, que recentemente tiveram lugar na Escola Secundária Alexandre Herculano, no Porto, aparecia o seguinte problema:
«O Alexandre e o Herculano estão na estação de Campanhã à espera do comboio. Para se entreterem decidem calcular o comprimento de um comboio de mercadorias que passa pela estação sem alterar a velocidade. Quando a frente do comboio passa por eles, o Alexandre começa a andar no sentido do movimento do comboio e o Herculano começa a andar no sentido oposto. Os dois caminham à mesma velocidade e cada um deles pára no momento em que se cruza com o fim do comboio. O Alexandre andou 45 metros e o Herculano 30. Qual o comprimento do comboio?»

Muitos jovens do Básico e do Secundário passaram meses a resolver problemas deste tipo. No começo das Olimpíadas, em Outubro, participaram duas dezenas de milhares de estudantes, em provas realizadas nas suas escolas. Foram seleccionados os que obtiveram melhores resultados, que competiram depois nas segundas eliminatórias. Daí passou-se à final, sempre com provas diferenciadas para os alunos do Básico e os do Secundário. Mas o problema com que começámos esta crónica apareceu em ambas as provas.
Para os finalistas, tudo isto é apenas um começo, pois agora há escolas de preparação dos jovens para as Olimpíadas Ibero-Americanas e para as Internacionais.

Com as Olimpíadas, tais como com o Campeonato Nacional de Jogos Matemáticos e com outras competições, todos lucram. Os melhores, claro, que passam muito tempo a treinar-se e a desenvolver o raciocínio matemático. E os menos preparados, que têm os seus colegas como exemplo e algo partilham sempre das suas preocupações e dos seus sucessos. Como no verdadeiro desporto, o que interessa é competir. Nem todos podem ser campeões da maratona, mas se todos se entusiasmarem em praticar alguma modalidade, o país fica mais saudável.
Os desafios e os jogos matemáticos treinam o raciocínio e desenvolvem o gosto pela resolução de problemas. Valorizam a lógica, o conhecimento matemático e a imaginação — todos eles aspectos complementares e não opostos da mesma capacidade de enfrentar o mundo. Ao contrário do que muitas vezes se diz, a lógica não se opõe ao conhecimento, tal como a aprendizagem não se opõe à imaginação. O treino matemático, mesmo que tenha aspectos repetitivos — e por vezes desinteressantes e aparentemente com pouco significado —, apenas pode ajudar o raciocínio. Permite estabelecer paralelos e visualizar mais caminhos para a solução dos problemas.
Se o leitor estiver a pensar no desafio com que começámos, tanto melhor. Não vamos dar a solução. Mas é importante perceber que há muitos caminhos possíveis para calcular o comprimento do comboio. E que só há uma resposta correcta.
Se o leitor gostar de métodos seguros, pode enfrentar o problema escrevendo um sistema de equações baseadas na relação distância = velocidade x tempo. Mas há quem goste de começar por fazer um pequeno desenho e tentar resolver tudo com base na geometria. E há quem prefira encontrar o caminho mais directo, que muitas vezes é o menos evidente. Assim se passa, em geral, com a matemática. Mesmo entre os profissionais, há quem se adapte melhor ao raciocínio algébrico, quem tenha maior intuição geométrica e quem seja um ás do cálculo numérico.
Não, não vamos dar a solução. Mas será que o comboio mede, em metros, uma vez e meia o número de maneiras distintas de colocar cinco pessoas na fila do autocarro? Afinal é fácil, dirão os olímpicos.
(*) Adaptado do «Expresso»

5 Comments:

Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

O que torna este problema MUITO curioso é o facto de a determinação do comprimento do comboio ser independente da sua velocidade e da velocidade a que andam o Alexandre e o Herculano.

Ao escrever as 2 equações em causa, deparamo-nos com 3 incógnitas (velocidade dos peões, velocidade do comboio e comprimento deste)pelo que, à 1ª vista, o problema é indeterminado.

No entanto, com um pouco de atenção vê-se que não é assim...

Se ninguém o fizer, apresentarei aqui, amanhã, a solução algébrica.

17 de abril de 2006 às 10:07  
Anonymous Anónimo said...

Percorridos 30 metros, o Herculano parou porque o fim do comboio passou por ele.
O Alexandre andou ainda mais 15 metros, até o mesmo lhe acontecer – portanto, enquanto andou esses 15 metros, o comboio percorreu a distância entre eles, quando pararam, isto é 75 metros, o mesmo é dizer, uma distância 5 vezes superior. Como os rapazes andavam à mesma velocidade, o comprimento do comboio será 5 vezes superior ao que o Herculano andou; seria portanto de 150 metros. Mas, como ele se deslocou 30 metros em sentido oposto ao do comboio, teremos que os juntar para termos o comprimento do comboio – 180 metros.

17 de abril de 2006 às 19:57  
Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

VC,

Exacto.

Eu ia apresentar a solução algébrica, mas esta é mais engraçada.

--

Já agora, o nº de combinações é = 5x4x3x2x1=120

1,5x120=180

17 de abril de 2006 às 20:59  
Anonymous Anónimo said...

Caro Carlos
Embora não seja a minha especialidade, gostava de ver (se é que consigo perceber) a solução algébrica.
Ab
VC

17 de abril de 2006 às 21:10  
Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

VC,

Seja, então:

C o comprimento do comboio
Vc a velocidade do comboio
Vp a velocidade dos peões (o Alexandre e o Herculano)

Há 2 situações de igualdade de tempos que dão origem a 2 equações:

A)O encontro do Herculano com a traseira do comboio dá-se no momento em que ele andou 30m e o comboio andou (C-30)

Assim:
(C-30)x1/Vc = 30/Vp

B)O encontro do Alexandre com a traseira do comboio dá-se no momento em que ele andou 45m e o comboio andou (C+45)

Assim:
(C+45)x1/Vc = 45/Vp

--

A 1ª eq. pode escrever-se: Vp/Vc=30/(C-30)

A 2ª eq. pode escrever-se: Vp/Vc=45/(C+45)

Assim: 30/(C-30)=45/(C+45)

A partir daqui, é fácil ... C=180

17 de abril de 2006 às 23:32  

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