A grande bola (*)
O leitor interessado pode ler um magnífico livro de Jorge Buescu onde este assunto se encontra muito bem discutido e clarificado. O volume intitula-se «Da Falsificação dos Euros aos Pequenos Mundos» e foi publicado em 2003 pela Gradiva. Vale a pena lê-lo, e não só para esclarecer este problema.
Há mitos semelhantes que persistem. Diz-se, por exemplo, que Copérnico e Galileu reuniram provas irrefutáveis do movimento da Terra e que, apenas por teimosia, ignorância ou dogmatismo religioso essas provas foram negadas. Também não é verdade, embora a teimosia, a ignorância e o dogmatismo religioso fossem reais.
A sombra da Terra na Lua durante um eclipse lunarCopérnico avançou um modelo cosmológico em que a Terra foi retirada do centro do Universo e colocada a orbitar o Sol. Quase um século depois, Galileu recolheu dados que refutavam o modelo de Ptolomeu e Aristóteles, mostrando que a Lua e o Sol não eram perfeitos e imutáveis, que o Universo não podia ter um centro único e que Vénus se encontrava umas vezes entre nós e o Sol e outras para lá deste. Mas esses dados não provavam irrefutavelmente que a Terra rodava nem que orbitava o Sol.
Depois do julgamento de Galileu de 1633, tão dramaticamente retratado na peça actualmente em cena no Teatro Aberto, em Lisboa, os dados começaram a acumular-se. Em 1638, o sábio italiano escreveu e fez publicar os «Discursos e demonstrações matemática sobre duas novas ciências», com que colocava a dinâmica em bases científicas e fornecia instrumentos de resposta às objecções ao movimento da Terra. Meio século depois, com os trabalhos de Isaac Newton, o sistema heliocêntrico apareceu coerentemente explicado pela nova física. Os homens de ciência deixaram de se questionar sobre o movimento da Terra, que tão difícil tinha sido aceitar.
A primeira prova directa de que o nosso globo se move, contudo, teve de esperar outro meio século. Foi o astrónomo James Bradley quem finalmente, em 1720, descobriu um fenómeno inesperado: a chamada aberração das estrelas, apenas explicável pelo movimento da Terra em torno do Sol. Mas a discussão dessa prova terá de esperar por uma nova crónica. Não demorará, certamente, meio século.
(*) Adaptado do «Expresso»
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