O NATAL DO CDS
AO NATAL, festa do amor, da compaixão e da partilha, renderam-se, talvez piegas, todos os partidos, de social-democratas a comunistas. Só o CDS foi imune aos eflúvios da quadra. E, por isso, a concelhia de Lisboa escolheu a manjedoura de caserna, as rações de combate e um rancoroso comício para lhe dar corpo e sentido.
Ciente da prata que tem na casa, Ribeiro e Castro nem apareceu, preferindo exibir outras obrigações de militância. Mas Paulo Portas esteve lá e emprestou o sorriso à rebelião. O sorriso, a palavra não. Para quê deixar-se aprisionar nas palavras ditas? Essas ficaram a cargo de Nuno Melo, um impetuoso cultor da pequena glória do minuto. E as palavras levaram à sua reprovação e crítica pela Comissão Política e à exigência de que o líder parlamentar se demita. E esta ao voto de confiança política de onze, sobre doze, deputados e à defesa pública de Nuno Melo por Telmo Correia. E esta a novas exigências de demissão, por parte de membros daquela comissão. Enfim, coisas que não se adivinhavam em adversários jurados da eutanásia.
O que fica do CDS para o Ano Novo? Extremaram-se os campos e, sem o custo incomportável da derrota perante o seu eleitorado, ninguém guardou margem para recuo. Talvez a intenção dos deputados fosse apenas mais um corrosivo episódio de guerrilha: levar a direcção a abater o líder parlamentar, para que outro viesse com as mesmas posições provocatórias e rapidamente se pudesse dizer que as culpas da má articulação política estão na direcção, que entra em conflito com todos os líderes. Mas Nuno Melo agarrou-se ao lugar e os seus pares pregaram-no a ele. E, assim sendo, só restam dois cenários. Um é o apocalíptico, que é o de onze deputados passarem a independentes, enriquecendo-nos com a experiência de um partido sem deputados, perdidos para um grupo de deputados sem partido. Nunca se perceberia porque se teriam estes auto-excluído de um congresso que, devagar, lhes vai sorrindo, sujeitando-se à aventura aleatória de ir constituir de raiz um partido liberal-conservador. O outro é a agonia e o pântano. Prosseguem as provocações, as exigências e as condenações, e nada acontece. Como se portugueses e castelhanos ainda hoje se entreolhassem em Aljubarrota, impossibilitados de recuar e temendo combater, mas apegados aos seus interesses dinásticos e descurando saber de Cavaco e Sócrates, de Juan Carlos e Zapatero. Quaisquer eleições acabam com todas essas fantasias.
«DN» de 24 Dez 06
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