8.7.07

O CORRER TANTO DELES TAMBÉM JÁ NOS CANSA

Por Ferreira Fernandes
A MANIA VEIO, como é costume nelas, da América. Começou com o simpático gordo Bill Clinton a correr. Jogging, chamou-se-lhe. Agora, a Europa está cheio de políticos suados a correr. Nicolas Sarkozy e o nosso José Sócrates pertencem aos fãs. Ao francês, os compatriotas até já lhe chamam "Nikeolas".
Aos portugueses no estrangeiro dá-lhes saudades. A Sócrates dá-lhe para correr. Por cá não tenho notícia, mas ele mal se apanha na baía de Luanda ou no Kremlin calça as sapatilhas. É o tipo de político sempre atento ao que se pode dizer. Apanhado a correr por cá dava azo a pensar-se que seria por causa do preço da gasolina.
Faz-se jogging, diz-se, para a saúde cardiovascular e para adensar os ossos. Mas tendo a coisa partido de Clinton eu suspeito que o exercício é bom, mesmo, para baixar os níveis da testosterona. Pelo menos no caso dele, correr era para esconder, para abafar pulsões. Mas hoje são tantos os políticos a fazer jogging que não é crível que o que se passava na Sala Oval se passe em todos os gabinetes ministeriais pelo mundo fora. Como na política o que parece é, correr - com a fama que tem de libertar de excessos de líbido - serve para nos sugerir que temos garanhões a mandar em nós. Daí haver tantas fotografias deles a correr. Pura propaganda machista.
Quando não correm, fazem judo, como Putin, jogam futebol a três mil metros de altura, como Evo Morales, ou fazem maratonas de insultos a Bush, como Hugo Chávez. George Bush dedica-se a exercícios ainda mais penosos: alinhar frases. Um político, hoje, é um sportsman ou arruma as botas. Até Fidel de Castro, da primeira vez que os médicos o deixaram levantar-se (a frase correcta é: quando os médicos acharam que o Fidel lhes permitia dar alta a Fidel), correu a vestir um fato de treino.
Longe vão os tempos em que os grandes políticos se mostravam com as mãos ocupadas, e não por halteres. Género Churchill, com charuto e uísque. Nesse tempo, suor de político não era medalha. Muito pelo contrário: Churchill despachava sobre a invasão da Normandia com o general Eisenhower metido na banheira. Ele, Churchill, na banheira. Porque Eisenhower só entraria na banheira com outro ser humano se este fosse a sua secretária. Sem saber que iniciava, aí, uma tradição entre os presidentes americanos que obrigaria outro, mais tarde, a inventar o jogging.
Além de quererem dar-se ares de Clinton, há outras hipóteses para tanto jogging. Se calhar julgam passar a ideia de que um líder escuta melhor o seu povo quando gosta de se ouvir arfar. Outra hipótese: a segurança . No meu bairrro, se vejo um homem correr na rua, das duas uma: ou é ladrão ou vítima. Vendo nos jornais a foto de pessoas respeitáveis correndo, ficamos com a convicção de que fugir não é tão mau como isso.
«DN» de 8 de Julho de 2007 - [PH]

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