PASSEIO ALEATÓRIO
O filósofo e o agente secreto
Por Nuno Crato
NUM PLANETA a cerca de 63 anos luz da Terra, um grupo de cientistas acaba de descobrir água. Quem ficaria espantado se pudesse ler a notícia seria o filósofo positivista Auguste Comte, que em 1842 afirmara «jamais se conhecerá a composição química dos astros». Mas conhece-se, e conhece-se ainda mais. Neste caso sabe-se, por exemplo, que o planeta demora cerca de dois dias a dar uma volta à estrela. Sabe-se que tem uma massa um pouco superior à de Júpiter. E sabe-se que a temperatura da sua atmosfera é cerca de 700 graus Celsius.
O mais curioso será perceber como tudo isto se descobriu. Em 2005, os cientistas detectaram o planeta verificando uma mudança periódica na luminosidade da estrela. Essa mudança de luminosidade, concluíram, é devida à passagem de um planeta à sua frente. Pela redução da luminosidade estimaram o tamanho do planeta, pela periodicidade dessa redução estimaram a sua órbita e a partir daí a sua massa. Agora, utilizando o telescópio espacial Spitzer, mediram a redução de luminosidade da estrela em comprimentos de onda muito precisos. A passagem do planeta reduz todos os comprimentos de onda, mas a atmosfera do planeta absorverá mais uns do que outros. Notando que a absorção em determinado comprimento de onda de infravermelhos (3.6 micrómetros) é menor do que noutros, concluíram que existem moléculas de água na atmosfera. Nenhumas outras se comportam dessa forma.
O filósofo francês oitocentista tinha-se precipitado sobre a incapacidade dos astrónomos para conhecer astros distantes. Mais prudente era o agente James Bond: «Never say never... again»
«Expresso» de 21 de Julho de 2007
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