A minha Bettie
Por Joaquim Letria
FAÇO AQUI ESTA CONFISSÃO, penitenciando-me dos pensamentos pecaminosos para onde aquela mulher me arrastou, na sua inocência.
Encontrava-me com ela debaixo da grande mesa da casa de jantar, em cujas traves escondia as suas fotos em dois números da revista “Beauty Parade” que roubara a um tio. Nem ela imagina os passeios que demos, o carinho com que lhe tirava o resto da roupa e a paixão com que a beijava na boca, como faziam no cinema.
Houve um grande jantar em minha casa e ao esticarem a enorme mesa para lhe acrescentarem uma tábua, descobriram o meu tesouro de fotos de Bettie Page.
Rasgaram-me as revistas, levei duas palmadas e o meu avô perguntou-me se eu queria ficar cego.
Nunca mais vi a menina do Tenessee, nem ouvi o seu doce sotaque, nem li sobre o seu mestrado e desconheci o resto da sua vida, dedicado à família e à religião. Conseguiram separar-nos até a morte trazer de volta a minha Bettie.
«24 Horas» de 22 de Dezembro de 2008
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