Apontamentos de Lisboa
QUANDO, hoje de manhã, este sem-abrigo acordou, deu por si com uma quantidade de turistas a olharem para ele...
Quem sabe onde se passou a cena?
Quem sabe onde se passou a cena?
A quem der a resposta certa, será oferecido, como prémio, um livro policial (que não foi reclamado pelo vencedor de um passatempo recente).
Actualização (18h24m): a resposta certa já foi dada, como se pode ver [aqui].
Se alguém quiser comentar esta chaga social, poder-se-á fazer uma 2ª fase do passatempo. Pelo menos, já se arranjou um voluntário para as funções de júri, que é sempre a parte mais difícil...
Actualização (2 Set 09 / 13h40m): dado que só houve 3 participações na 2ª fase, e todas boas, o Sorumbático resolveu premiar Dana_Treller, Nunormg e Paulo, deixando para mais tarde a decisão do seu ordenamento. Os 3 têm, agora, 24h para escreverem para sorumbatico@iol.pt indicando 2 ou 3 livros (por ordem decrescente de preferência) de entre os indicados [aqui].
Actualização (18h24m): a resposta certa já foi dada, como se pode ver [aqui].
Se alguém quiser comentar esta chaga social, poder-se-á fazer uma 2ª fase do passatempo. Pelo menos, já se arranjou um voluntário para as funções de júri, que é sempre a parte mais difícil...
Actualização (2 Set 09 / 13h40m): dado que só houve 3 participações na 2ª fase, e todas boas, o Sorumbático resolveu premiar Dana_Treller, Nunormg e Paulo, deixando para mais tarde a decisão do seu ordenamento. Os 3 têm, agora, 24h para escreverem para sorumbatico@iol.pt indicando 2 ou 3 livros (por ordem decrescente de preferência) de entre os indicados [aqui].
19 Comments:
Não é para prémio, mas já que ninguém aceita o desafio, aceito-o eu!
Arrisco: Praça da Figueira
Errado...
Praça dos Restauradores
Errado...
Belém...?
Bem...
Acho que vou oferecer um prémio a quem acertar.
Uma 'dica':
A estátua é de um senhor que disse a famosa frase (já em tempos aqui referida):
«Não me obrigueis a usar a força para vos libertar!»
D. Pedro IV... Claro, Terreiro do Paço... Param por lá muitos sem-abrigo...
No Terreiro do Paço (ou Praça do Comércio - seu nome actual) está a estátua equestre de D. José.
Já houve 3 respostas com a classificação de "muito quente":
Duas em termos topográficos (uma centena de metros de erro), e uma 3ª em termos do objecto da estátua.
:) Rossio, ou Praça D. Pedro IV.
Rossio, claro. Praça D. PEdro IV
Apesar de ter morado em Lisboa uns anos, ainda não consigo contornar a 'mistura' inconsciente de praças e estátuas. Quando penso no Rossio, julgo sempre que é uma estátua a Camões que lá está. E isto repete-se por mais vezes que me corrijam... Há coisas...
'Chaga de Lisboa'? :) Não creio que seja uma questão da cidade...
Durante uns meses colaborei com uma das muitas (e acreditem que são bem mais do que pensamos) associações que dão apoio aos 'sem-abrigo'. Filo porque me sentia curiosa em relação a eles, não percebia como se chega a um extremo tamanho...
Foi das experiência mais enriquecedoras que já vivi. Dela tirei várias conclusões, daquelas baseadas no que vi e ouvi por eles contado.
Muitos (atrevo-me a dizer que é a maioria) estão na rua porque querem. Todos eles trazem aos ombros um enorme peso (desde adições que não controlam a famílias despedaçadas)... Os que têm idade para tal, até trabalham... Mas o dinheiro no fim do mês não chega para pagar o quarto + tabaco, álcool, droga... o que quer que seja. Optam por viver sem morada, pertencendo a um status do qual a sociedade nada espera. Como tal, não têm que dar nada, não têm que provar nada, e sentem-se livres. Entre eles entendem-se muito bem. Afastam-se dos que oferecem perigo ou animosidade, e todas as noites há quem lhes distribua comida e cobertores no inverno, havendo ainda algumas associações (como aquela com que colaborei) que perguntam especificamente o que lhes faz falta e que depois tentam arranjar (desde pentes a sabonetes, botas, calças...).
Intuí que não haveria forma de os tirar da rua... Entre isso e a falta de tempo, acabei por descontinuar a colaboração com a associação. Mas aconselho, quem estiver disposto a tal, a passar algum tempo com eles. Não há como ver com os próprios olhos...
Em França (nomeadamente em Paris) há um tipo muito específico de sem-abrigo. São os "clochards", amplamente retratados na literatura, quase sempre relacionados com os cais e as pontes do Sena.
Ao contrário dos nossos (julgo eu), muitos deles recusam a ajuda-dita-tradicional.
Pelo que percebi, o sem-abrigo 'tipo' aceita ajuda até onde quer... Comida, roupa, ajuda com burocracia que o impeça de fazer alguma coisa que queira... Tudo isso é bem vindo.
Mas há coisa que recusam: emprego, contactos com assistente social, mesmo quarto (principalmente quando isso implica 'prestar contas' a alguém)... Depende da pessoa, mas regra geral não deixam que os tirem da rua.
Dado que Simenon, apesar de belga, retrata, como ninguém, esse sub-mundo de Paris, o prémio será um livro de sua autoria (talvez de Maigret).
Sem-abrigo,
sem-tecto,
sem-família, por certo...
Sem-tv,
sem-pc,
também servem para quê?
Sem-cama,
sem-colchão,
aquecidos por cartão...
Mas têm o que comer
e casa?
A Câmara andava a oferecer!
E se quiserem trabalho?
Ou preferem esperar,
E não fazer um... esforço?
Sem cama, nem colchão
mas com alma e coração!
Como chegaram aqui?
Foi ao que a vida os levou,
ou a mesma que os abandonou?
Aquele sem-abrigo que eu nunca conheci
Decorria o ano de 1994. Eu tinha acabado de ingressar no 1º ano do Curso pós-laboral de Direito da Universidade Autónoma de Lisboa. Recordo-me dos fins de tarde em que, antes de me dirigir para a sala 25 e assistir às aulas teóricas da cadeira de Introdução ao Direito que tinham o seu início por volta das 18:30h, passeava sozinho pela Rua de Santa Marta, admirando o exterior do Palácio dos Condes do Redondo, o edifício senhorial seiscentista que alberga aquele pólo universitário.
Foi neste contexto que me encontrei a deambular pelas ruas adjacentes. Entre elas, havia uma que era um local de passagem diário: a Rua Camilo Castelo Branco. Nesta rua situa-se a Igreja do Sagrado Coração de Jesus, uma igreja paroquial que pertence ao Patriarcado de Lisboa.
À noite, no ocaso das aulas e quando me dirigia para o a antiga estação do metropolitano da Rotunda (actualmente estação do Marquês de Pombal), costumava passar em frente à Igreja. Junto à entrada principal do edifício podia constatar que encontravam guarida alguns pobres sem-abrigo, deitados em cima de enormes cartões de papelão que desordenadamente dispunham em formato de cama, no chão frio da calçada de pedra, e tapados unicamente com velhos cobertores gastos pelo tempo e rasgados pelos infortúnios daquela vida.
Certa noite, quando cheguei a casa vindo das aulas e me encontrava já na cozinha a jantar com a televisão ligada, chamou-me à atenção uma reportagem de um canal que não me ocorre agora qual de momento. A referida reportagem dava conta precisamente dos sem-abrigo de Lisboa e nela estavam a ser entrevistados alguns sem-abrigo da zona da Baixa lisboeta, do Martim Moniz e… da Rua Camilo Castelo Branco.
A dada altura falou um senhor, com cerca de 50 anos, que não quis dizer o nome. Afirmava perante a jornalista que era viúvo e que não tinha filhos. Dizia ainda que tinha um curso superior sem, no entanto, dizer qual.
Pareceu-me um homem sensível, inteligente, bom comunicador, mas algo perturbado.
Nitidamente incomodava-o o facto de estar a ser entrevistado para a televisão, pois não olhava a direito para a câmara. Parecia, contudo, ansioso por transmitir algo a alguém. Talvez uma mensagem para alguém conhecido dele? Ou um recado importante para alguém?
O facto é que a reportagem prosseguiu e aquele sem-abrigo, que nunca olhou directamente para a câmara que captava as suas imagens, não falou mais nada. Limitou-se a responder às perguntas que lhe faziam, respondendo como podia.
Não fui a única alma a ver aquela reportagem naquela noite. No dia seguinte os comentários dos meus colegas incidiam sobre o programa que tinham visto na véspera, na televisão. Toda a gente conhecia a Rua e aquela realidade.
Senti uma enorme vontade de ir ao encontro daquele homem e perguntar-lhe, afinal, o que é que ele queria ter dito mas não disse. O que sentia? O que queria? O que é que lhe fazia falta? Tudo certamente.
No entanto, nunca o encontrei. Procurei algumas vezes por entre aquelas pessoas, sem no entanto perguntar a nenhuma delas quem era aquela pessoa e onde se encontrava. Na nossa mais tenra idade, não somos capazes de ser decididos o suficiente e de fazer o que seria necessário para atingir determinado objectivo. Ao meu alcance estava ajudar aquele pobre homem sem-abrigo de uma rua de Lisboa. Tinha na altura 19 anos. Fui incapaz e a vida universitária prosseguiu o seu rumo normal. Para ser verdadeiramente honesto, houve outros interesses relacionados com o curso que surgiram e que me captaram todas as minhas atenções.
A derradeira verdade nestas minhas pequenas notas de memória é que eu não soube mais nada acerca daquele homem.
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