20.8.11

As gravuras que não sabem nadar

Por Antunes Ferreira

DURANTE doze dias deambulei pelo Reino Maravilhoso – foi um ilustre trasmontano de São Martinho da Anta, o licenciado em medicina Adolfo Correia da Rocha que assim escreveu – e voltei de cabeça lavada, de olhos lavados, de alma (se é que a temos…) lavada. Miguel Torga que, em meu entender e no de muito boa gente devia ter sido o Português Nobel da Literatura, grafou então frase que ficaria nos anais da cultura nacional: «para cá do Marão, mandam os que cá estão». Mas o escritor imenso não era comunista, nem teve nenhuma Pilar del Rio…
Há anos que por ali não andava. A Bragança, recordo-me vagamente, tinha os meus onze anos, fui numa excursão da minha turma no Liceu Camões. Um largo hiato se registou até que pelos anos oitentas um bom Amigo me levou até Vila Real, Chaves e Murça, a ver o berrão de seu nome A Porca.
Agora, tirei a barriga de misérias. Em todos os sentidos, porque na região tudo é excelente, incluindo a comida e a bebida. As montanhas – excelentes; as paisagens – excelentes; as gentes – excelentes e as curvas – excelentes. Das estradas com pavimentos quase excelentes, tenho de o dizer. E as das moçoilas não lhes ficam atrás.
Trás-os-Montes, no que respeita às comunicações rodoviárias está numa revolução: as obras da auto-estrada que chegará a Bragança fervilham, os desvios são uma constante, respira-se trabalho por todos os poros. Por entre montes e vales, o que quer dizer a subir e a descer continuamente, as curvas repetem-se, acrescentam-se. De tal sorte que lá meti requerimento às autoridades competentes para que me fosse passado diploma oficial de curvador encartado. Continuo a aguardar resposta. O documento fará parte da minha colecção de atestados e outros.

Uma dúvida, porém, me assaltou o espírito. O tráfego por aquelas bandas justificará a auto-estrada? Num território com uma elevada percentagem de emigração, que, infelizmente, agora se está repetindo, circulam, por vezes, viaturas espaçadas. Indústria, não há. O Cachão, do engenheiro Camilo de Mendonça da outra senhora, morreu depois do 25 de Abril. Restam as amendoeiras, as oliveiras, as vinhas, os cortiços do mel e da cera e um turismo incipiente.
Mas, alto lá. Tudo merecem as gravuras do Vale do Côa, nos seus 20 mil anos postos em sossego, como a Inês, que me emocionaram a tal ponto que se me humedeceram os olhos. E o fantástico museu sobre essa maravilha da arte rupestre ao ar livre, a maior e melhor do Mundo. Só as gravuras (que não sabiam nadar e continuam a não saber) justificam o que se faça.

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3 Comments:

Blogger teste said...

Olá Carlos Medina Ribeiro!

Um breve comentário...ainda não vi o museu, famoso, mas pelo que me contam, duvido que tenha valido o impedimento da construção da barragem. Tinha-se poupado muito dinheiro em importação de electricidade proveniente de centrais nucleares e as pedras...essa poderiam ter sido transladadas. Com o dinheiro poupado, as populações locais se calhar teriam lucrado mais...mas enfim, quem sou eu?!? Um simples contribuinte pagante de desvairios diversos como esse... :-(

Jesca!

20 de agosto de 2011 às 22:14  
Blogger teste said...

Apenas + 1 nota: qt à questão das AE, só quem não anda por lá é que pode "cantar de galo"...demorar 3 horas para ir de V.Real a Bragança é obra...é que são apenas 200km! E a AE vai servir também para ligar a Espanha, o que pode potenciar o transporte rodoviário de ligação aos portos nacionais (Leixões, Aveiro) sim, porque o país não é só Lisboa ou Sines... :-(

Jesca

20 de agosto de 2011 às 22:17  
Blogger Bmonteiro said...

«O tráfego por aquelas bandas justificará a auto-estrada?»
Assim falava o Zaratrusta Sócrates/BC (bloco central), quando respondia a alguns dos seus críticos: será possível admitir que Bragança não tenha uma AE?
Que esta ainda vá lá.
De espanto, fiquei eu há dois anos viajando um pouco a Norte da Guarda.
Foi quando a minha ignorância primária, vendo o rasgão que ia pela natureza, conseguiu entender o básico: o parto da Douro Interior que tinha visto referida na imprensa.
O intenso tráfego entre Guarda e Bragança, assim o quis.
A bem do Regime (falido)

20 de agosto de 2011 às 22:31  

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