Uma praga que merece mais atenção
Por Ferreira Fernandes
PEDRO
e Mónica separaram-se. Há dias, Pedro foi ao infantário onde a
ex-mulher ia buscar a filha de ambos, encontrou Mónica e uma amiga,
Inês, e matou ambas a queima-roupa. Depois, suicidou-se. A arma, um
revólver, tinha sido comprada na semana anterior. A um amigo, o Pedro
disse que "ia haver mortes". Um jornal escreveu, ontem: "Pedro estava
deprimido e não conseguia aceitar a separação de Mónica, ocorrida há
cerca de um mês."
Não sei, ando de táxi, paro nos cafés e leio jornais
mas confesso que ainda não tenho o curso completo de Psicologia. Embora
suspeite que uma separação pode deprimir um fulano, não sei se ela, a
depressão, pode levar ao assassínio. E como sei o suficiente de
português, sei que a frase "Pedro estava deprimido e não conseguia
aceitar a separação de Mónica, ocorrida há cerca de um mês" no contexto
de um artigo sobre assassínios, a modos que faz uma relação causa e
efeito entre a depressão e a ação de Pedro. O que me impediria de
escrever tal frase, que mais não fosse por respeito pelos deprimidos que
não são assassinos. Acresce que sei que demasiados portugueses matam as
mulheres e depois se suicidam (ou na versão mais comum, tentam
suicidar-se). Daí que, mais útil do que fazer Psicologia, os jornais
deveriam fazer um guia prático para os deprimidos que compram uma arma
para matar a mulher e depois suicidar-se. O guia teria um conselho
simples: invertam a ordem, comecem por se suicidar.
«DN» de 17 Jun 13 Etiquetas: autor convidado, F.F
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