O conclave da Quarteira
Por Baptista-Bastos
UM CORO de comentários indignados acolheu as palavras de Pedro Passos
Coelho, no conclave do Pontal, sobre os "riscos" impendentes das
decisões do Tribunal Constitucional. "Pressão inqualificável", "ameaça
despropositada", "desrespeito pela democracia", foram as qualificações
atrozes postas em circulação. Ninguém disse da raiz do melindre. Ao
assinalar os "riscos", o primeiro-ministro confessou, subliminarmente,
que os conhecia, que os enfrentara, malicioso, e tentava fintá-los, com
translúcido desprezo pelos juízes que compõem a instituição. Aliás, este
Governo tem sido fértil em desembocaduras deste estilo, interpretando a
Constituição como um empecilho incómodo, a evitar, a contornar, a
ignorar, a combater e, até, a destruir.
O mimoso encontro da
Quarteira apresentou voluptuosos decotes e míticos penteados (os
adjectivos podem, também, ser aplicados ao contrário), e a brisa
arrastou consigo doces odores de Chanel 5 e de Maderas del Oriente, que
se adquire a bom preço nos supermercados da fronteira. O Marcelo
asseverou, na TVI, que estava de acordo com a reunião, por causa do
"símbolo", e que, noutra circunstância, pagara do seu bolso ("muito
dinheiro", confessou) o preço do "símbolo", porque Mendes Bota lhe
revelara não haver dinheiro para suportar as despesas. Esta instrutiva
confidência deixou aos telespectadores duas particulares conclusões: o
PSD estava com os cofres vazios, o que será de espantar, e o Marcelo com
os bolsos cheios, o que não é surpresa por aí além, abençoado seja!
Passos
Coelho apareceu notoriamente fatigado e envelhecido, ombros descaídos,
costas curvadas, calvície à vista. Insistiu no sketch de que o rumo está
certo; vamos pagar caro um pouco mais; porém o tempo das flores já se
sente, foi o que disse, e é parvoeira. Creio que confundiu os perfumes
das damas com a metáfora desejada. Tudo isto sem fé nem convicção: um
realejo enfadonho, por gasto.
As câmaras de televisão deram, de
relance, o rosto amargurado do ministro Maduro, o qual exprimia a
dramática infelicidade de quem se sentia a mais, ali e no Governo. Os
operadores de imagem procederam a indagações de pormenor, no vão
empreendimento, calcula-se!, de filmar o dr. Pedro Lomba, secretário de
Estado de qualquer coisa que não fixei, e ex-comentador de hábitos e
costumes. O dr. Lomba, desde que, expeditamente, despediu do Governo o
colega do Tesouro, com a frase assassina, "incongruências
problemáticas", nunca mais foi visto em campo. É detestado, pela
circunstância de ter um ar enfatuado, de não dar bons dias a ninguém, e
de citar autores desconhecidos pelos seus pares. E, claro!, pelas tais
"incongruências problemáticas", cujo exacto significado constitui um
denso mistério.
Resumindo e concluindo: ignora-se para que serviu o Pontal, a não ser, acaso, por uma questão de "símbolo".
«DN» de 21 Ago 13 Etiquetas: BB
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