14.12.17

Portugal e a descentralização administrativa

Por C. Barroco Esperança
A regionalização do País, prevista na CRP, desde 1976, foi inviabilizada pelo referendo de 8 de novembro de 1998, resultante da maquiavélica proposta de Marcelo Rebelo de Sousa, então líder do PSD, e de um exótico mapa de 9 regiões, apresentado pelo PM, António Guterres.
O desinteresse do eleitorado, com menos de 50% de participação, tornou inconsequente a decisão, mas a dimensão do repúdio, superior a 60%, quer da regionalização, quer do mapa proposto, contra menos de 35% de votos a favor, trucidou a Regionalização do Continente.
É possível que o exemplo do poder autocrático e os desmandos da Região Autónoma da Madeira, onde se temia que um único partido e o mesmo soba se eternizassem, tornasse o eleitorado receoso da Regionalização, que era, e é, imprescindível. Aliás, na Madeira, só o referido soba foi substituído.

Com a regionalização adiada para as calendas gregas, pretende este Governo promover a descentralização, mas o primeiro anúncio foi claramente infeliz. A deslocação para o Porto do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I.P., sem ponderação nem justificação técnica, ameaça uma descentralização que precisa de ser explicada e aceite pelos portugueses.
Atribuir mais verbas e competências às autarquias parece uma boa ideia, mas a reduzida dimensão e a falta de massa crítica de muitas delas podem converter num sorvedoiro de dinheiros públicos e de discricionariedade uma legião de caciques que se limitem a criar postos de emprego enquanto a inexorável desertificação do interior se intensifica.
Não se pode descentralizar sem se saber para onde e por que razão. É impossível manter 308 Municípios e 3.092 Freguesias onde é exagerada a dimensão dos aparelhos político-administrativos, aquém dos das regiões autónomas. Corre-se o risco de atomizar o País, em vez de o modernizar, de criar empregos públicos e fomentar o caciquismo, em vez de relançar a economia rural, desenvolver a cidadania e promover a participação cívica.
Para pior, já basta assim.
Depois de um referendo, é politicamente insustentável uma decisão que o contrarie, sem o repetir, a menos que se assuma a regionalização, nos programas eleitorais, decisão que os partidos devem ponderar. A decisão pode e deve ser concertada entre partidos, como objetivo nacional, para 5 ou 4 regiões (Norte, Centro, Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve ou Alentejo/Algarve.

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11 Comments:

Blogger José Batista said...

Sempre tive dúvidas sobre a chamada «regionalização» do país. E sempre me pareceu que um rectângulo com 600 x 160 Km (uma região, afinal), na era da tecnologia informática, não poderia ser difícil de governar, e de modo próximo, se os governantes o soubessem fazer e os cidadãos o soubessem exigir.
Aliás, autarquias como as Juntas de Freguesia, que não deviam ser obrigatoriamente fundidas, e podem desempenhar um papel muito útil junto das pessoas, poderiam facilmente não constituir um peso financeiro para o país: bastava que se constituíssem com pessoas que, por lei não pudessem receber qualquer paga monetária ou outra pela honra e pelo privilégio de servir a comunidade. E freguesia que não tivesse ninguém disponível extinguia-se automaticamente, sem mais acesso aos fundos orçamentais.
Era ver quantas ficavam desertas...

14 de dezembro de 2017 às 12:09  
Blogger opjj said...

Regionalizar ou retalhar? Já há poucos caciques, que mesmo assim empregam toda a família. Temos o grande orientador das massas o imperador CÉsar dos Açores.E o Zé não sabe metade da missa.

14 de dezembro de 2017 às 17:26  
Blogger SLGS said...

A reforma Administrativa do país é uma necessidade absoluta e, para ser verdadeiramente efectiva, só o pode ser com um consenso alargado a todos os partidos representativos do povo. Sem isso, não passará de mais um motivo de divisão e instabilidade.
Estou de acordo com José Batista, pois com a dimensão geográfica que temos, regionalizar não é mais que retalhar e criar novos "Terreiros do Paço" e todas as sub-estruturas inerentes. Sério risco de catalisar novos caciques e os seus "boys" e institucionaliza-los em permanência no poder.

15 de dezembro de 2017 às 16:50  
Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

Por mim, podem fazer o que quiserem, mas julgo que o problema é o seguinte:
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Para haver Regiões, tem de haver "Governos Regionais".
Ora, qualquer português liga logo essa expressão ao Alberto João Jardim — e, chegando aí, o tema fica arrumado...
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Mas há mais:
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Facilmente imaginamos personagens como Valentim Loureiro, Fátima Felgueiras, Avelino Ferreira Torres e Pinto da Costa a povoar esse mundo, com os seus adjuntos, assessores, secretários, carros de serviço, etc.
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NOTA pessoal:
Eu sou do Porto, e a minha vida oscilou sempre entre essa cidade e Lisboa.
E sei muito bem o que é o bairrismo cego, o ódio a Lisboa, etc.

15 de dezembro de 2017 às 17:28  
Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

Resumindo:
Eu não digo que, um dia, não se venha a fazer essa (ou outra) regionalização.
Digo apenas que, se depende de um rereferndo, será praticamente impossível convencer os portugueses actuais da sua bondade.

15 de dezembro de 2017 às 17:35  
Blogger Carlos Esperança said...

Caros leitores:

Uma regionalização administrativa não precisa de ser política.

Tal como o Eng. Medina Ribeiro, lembrar-me-ia logo de A. J. Jardim.

Poderia, se o eleitorado o decidisse, ter um presidente nomeado pelo Governo. Mudava o Governo, mudavam os presidentes das Regiões Administrativas, criadas à custa da redução das autarquias existentes.

15 de dezembro de 2017 às 17:39  
Blogger opjj said...

Ao Sr. Carlos Medina Ribeiro. Nas suas notas pessoais toca em 2 pontos:
1- bairrismo cego e o ódio a Lisboa.Confirmo.Trabalhei algum tempo no Porto e não sou de Lisboa, no entanto fui prejudicado com esse faccioso e doentio regionalismo.
2- Das personagens que mencionou, não conheço nenhuma,Valentim,Fátima, Avelino e Pinto da Costa, nenhuma delas enfiou tantos familiares e amigos no Estado como os governos do PS.Que eu saiba só a Fátima tem uma filha numa TV.
Não sou advogado de nenhuma.

15 de dezembro de 2017 às 18:20  
Blogger SLGS said...

Mas,caro Carlos Esperança, isso não seria voltar aos Governos Civis?

15 de dezembro de 2017 às 23:54  
Blogger Carlos Esperança said...

SLGS:

De facto, a sua pergunta é pertinente, mas o presidente da Região Administrativa teria competências bem mais vastas e assumiria as que, depois do desaparecimento dos Governadores civis, ficaram órfãs.

A coordenação dos meios de proteção civil ainda esperam por responsável distrital. Não falo dos municípios cuja responsabilidade é grande e ninguém tem coragem de denunciar.

16 de dezembro de 2017 às 00:42  
Blogger Ilha da lua said...

Sinceramente,num país tão pequeno não sei qual seria a melhor solução Com algumas excepções,parece-me que o problema reside na falta de preparação dos autarcas,e,na falta de apetência dos eleitores para exercerem o seu dever de cidadania.De uma maneira geral,somos um povo conformado,com um medo atávico de enfrentarmos o poder

22 de dezembro de 2017 às 22:44  
Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

Ilha da Lua
Não imagina as histórias que eu poderia aqui contar de pessoas que têm medo de enfrentar o poder (ou de simplesmente o criticar).
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Até 2 queixas que fizemos à ASAE (contra a C.M. Lagos), este mês, foram considerados actos de heroísmo!
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Mesmo que apenas se critiquem as Finanças, ou a Junta de Freguesia, ou a PSP ou os CTT, as probabilidades de sofrer represálias (ou meras pressões, ou insultos no Facebook) são muito grandes.

23 de dezembro de 2017 às 10:07  

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