O regresso das religiões em estado selvagem e os seus ímpetos belicistas
Por C. B. Esperança
Por todo o Mundo, a política está a ser capturada pelas religiões. As democracias secam ao som de cânticos ao Divino e anátemas às liberdades individuais. Clérigos de todas as fés assumem a relevância que os padres perderam na Europa com a repressão política de que foram alvo e que permitiu o surgimento da laicidade e das democracias liberais.
A igualdade entre homens e mulheres, a autodeterminação sexual da mulher, o respeito pela sua saúde reprodutiva, em suma, os Direitos Humanos, só foram possíveis com a separação do Estado e das Igrejas, contida a alegada vontade divina interpretada pelos funcionários de Deus.
O proselitismo e a luta entre religiões regressam em força à sombra das liberdades que a democracia exige, e bem, e da cumplicidade que os oportunismos eleitorais atraem.
A violência pia estrou numa espiral que subverte as democracias e reforça as ditaduras, desde os estados falhados aos mais avançados países do Planeta, das tribos medievais às democracias aparentemente consolidadas.
O Afeganistão é o caso mais dramático e grotesco, onde o mais implacável monoteísmo regressou recentemente ao poder numa brutal fusão com o tribalismo, na apoteose misógina que exonerou os direitos humanos e reconduziu as mulheres à escravatura.
Na Birmânia, o budismo, sob traje monástico ou dentro de botas e fardas militares, leva a cabo o genocídio dos rohingyas e impede o advento da democracia.
As teocracias muçulmanas no Médio Oriente, África, Europa, ou onde quer que medrem sob os escombros de democracias ou ditaduras laicas, erradicam religiões concorrentes e reduzem as mulheres à condição de propriedade dos homens.
Na Turquia, o Islão é o combustível que incinera a República laica de Atatürk e apoia o proto-califa Erdogan na difusão de mesquitas, na Europa e em África, e no genocídio dos curdos. A agência turca (Tika), com enormes recursos financeiros, é o instrumento do PR para renovar túmulos, santuários e mesquitas oriundos do Império Otomano nos Balcãs e projeta novos locais de culto na região, Macedónia do Norte, Kosovo, Albânia e Bósnia-Herzegovina para espalhar a fé e a espionagem através de imãs.
Na Rússia, a Igreja Ortodoxa abençoa guerras e benze canhões para todos os conflitos, na Síria, na Ucrânia ou onde o autocrata de turno quiser.
Na Índia, a “maior democracia do Mundo”, Modi é um ditador democraticamente eleito com folgadas maiorias graças à radicalização do nacionalismo hindu, exacerbado contra indianos muçulmanos, defensor da hierarquia das castas e ansioso do regresso à tradição de meter as viúvas na pira que incinera os maridos defuntos.
No Brasil e nos EUA a cruzada evangélica, de contornos nazis, causa inquietude quanto ao futuro das respetivas democracias depois de terem levado ao poder figuras repulsivas como Bolsonaro e Trump, com risco de reincidência. O fundamentalismo evangélico e o ódio aos direitos individuais exercem um proselitismo militante com futuro garantido no Supremo Tribunal dos EUA nas próximas décadas.
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