5.8.22

Olhar para ontem acreditando no amanhã

Por Joaquim Letria

Penso eu que a melhor maneira de fugirmos a este mundo de hoje é mergulharmos de vez em quando nas realidades do antigamente e, através das mais diversas manifestações de fé nos homens, distrairmo-nos com a arte, com o pensamento filosófico, quer na ciência quer na política.

O tempo prodigioso que medeia entre o século XIV até ao princípio do século XVI foi, em todos os sentidos, uma verdadeira renovação através da qual o homem abandonou as tristes certezas da Idade Média para se lançar na mais bela aventura da criação.

Foi um tempo de renascimento, uma verdadeira Primavera, na qual o homem se redescobriu com surpresa e deleite sendo capaz de recuperar as emoções, os pensamentos e as esperanças na mais variada e pletórica plenitude.

Com espanto, o homem redescobre os antigos, ao mesmo tempo que o latim eclesiástico se transforma num espantoso instrumento de transformação, de novidade e de comunicação.

Com a redescoberta dos antigos cria-se um novo sentido de vida e do mundo. Mais tarde, o homem junta a toda a variedade e surpresa dos clássicos o novo mundo com requintes e profundezas orientais a que se somará mais tarde o novo mundo americano que transmite a ilusão duma herança sem limites.

A ciência deu-nos outros olhos para ver e compreender a realidade. As Artes Plásticas e a palavra viva levam-nos a estudar, a compreender novas línguas, sem trair a devoção pelo latim, e o entusiasmo de criar as literaturas.

O cisma religioso vai desembocar num novo tempo de guerras e de preocupações em muito semelhante ao que vivemos hoje num momento tão conturbado por tenebrosas razões de saúde e de fome.

É possível que os erros dos humanistas nos tivessem levado a situações irrealizáveis como a própria História em parte demonstra. Mas tal não apaga o inenarrável prazer nas escapadelas que por lá podemos experimentar e que ainda hoje podemos dar, acreditando em algo bem mais harmonioso, inteligente e sensível do que aquilo que hoje temos. Não é fácil. Mas temos de olhar para trás acreditando no futuro. Tirando o maior prazer daquilo que se nos oferece. Olhando para ontem acreditando no amanhã.

Publicado no Minho Digital

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