Bolas sim, bombas não
MAIS agressivos e violentos do que os militantes das claques de futebol talvez só os colunistas que, neste país de brandos costumes, incitam à guerra com uma ferocidade inusitada - desde que as bombas, convencionais ou nucleares, não lhes caiam em cima, é claro! A tragédia iraquiana não lhes serviu de emenda. Só o ex-primeiro-ministro Durão Barroso, que esses nossos ideólogos bombistas de secretária tanto apoiaram, se retractou, tarde e a más horas. Eles não. E o que hoje pretendem é que o inefável George W. Bush bombardeie o Irão - com armas nucleares tácticas, se necessário for. Tudo pela paz.
Todavia - e é por isso que trago este tema à colação -, as bolas de futebol podem ser armas diplomáticas bem mais eficazes e bem menos devastadoras do que as bombas. Como há poucos dias escrevia no Público Jorge Almeida Fernandes, um dos melhores e mais sensatos jornalistas portugueses especializados em política internacional, "mais do que os raids, o Irão teme o isolamento internacional" e "a recente ameaça de ser banido do Mundial de futebol gelou a opinião pública iraniana". Citando um texto não menos sensato de Jonathan Freedland, no jornal Guardian: "A comunidade internacional pode explorar estas condições, mas apenas se se mantiver unida." Bolas sim, bombas não.
Como o Irão vai ser adversário de Portugal no Grupo D da fase final do Mundial de 2006, na Alemanha, espera-se que os nossos ideólogos bombistas não aconselhem os nossos jogadores a utilizar bombas miniaturizadas em Frankfurt, a 17 de Junho, dia em que as duas selecções de futebol se defrontam. Neste, como nos outros jogos, as únicas "bombas" úteis e legítimas serão os remates violentos e certeiros à baliza do adversário. Mesmo que não nos poupem a mais do mesmo, ou seja, ao "folclore" nacionalista que caracterizou a nossa participação no Euro de 2004, em que disputámos e perdemos uma final que parecia estar no papo. Bem melhor, contudo, do que no Mundial de 2002.
Agora que, no futebol doméstico, já há campeão e só falta disputar e erguer mais uma Taça de Portugal, todos os adeptos da selecção alimentam grandes esperanças num Verão radioso, durante o Mundial de 2006. Tal como na Roma imperial e decadente, um país em crise precisa de panem et circences (pão e circo), como derivativo efémero para as suas preocupações. Se o próximo Verão será ou não radioso para as nossas cores, isso já é outra história que depende desses emigrantes de luxo que são quase todos os nossos "pés da Pátria". Se a coisa der para o torto, como no Mundial de 2002, teremos sempre a hipótese de substituir a fome de bolas de futebol pelo prazer das bolas-de-berlim. Seja lá como for, mais vale apostarmos num Verão radioso do que num Verão radioactivo.
Crónica de Alfredo Barroso publicada no «DN» de hoje, aqui transcrita com autorização do autor
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