14.6.06

A VER VAMOS (*)

JÁ SE SABE que o futebol é um jogo, com tudo o que pode implicar de aleatório e imprevisível. Também se sabe que o futebol é uma festa popular, com todas as ilusões e excessos que pode induzir. Mas convirá não esquecer que o futebol de alta competição também é um espectáculo interpretado por profissionais, muitos deles pagos a peso de ouro. E é precisamente este último aspecto que justifica todas as expectativas e legitima os diferentes graus de exigência dos adeptos em relação às equipas que apoiam.
No jogo entre Portugal e Angola, o que mais terá impressionado muitos adeptos portugueses, entre os quais me incluo, não foi tanto a escassez da vitória (1-0), que até podia ter sido mais folgada se a bola tem entrado mais vezes na baliza angolana durante o primeiro quarto de hora. Foi, sobretudo, a palidez da exibição, que se acentuou a olhos vistos à medida que o tempo passava. A tal ponto que a selecção portuguesa terminou o jogo a praticar um futebol de contenção para evitar um susto e garantir a vitória.
O que não deixa de ser preocupante, se tivermos em conta que o jogo era entre uma selecção de elite ou, se preferirem, do primeiro escalão do futebol europeu, e uma selecção bastante modesta, do terceiro ou quarto escalão do futebol mundial. Angola é, parece-me, uma das duas ou três equipas mais frágeis, entre as 32 que chegaram à fase final deste Mundial 2006. Claro que ninguém estaria à espera que Portugal infligisse a Angola uma espécie de «massacre futebolístico neocolonial». Mas é bem verdade que a exibição desgarrada e frouxa dos «pupilos» de Luiz Felipe Scolari soube a pouco.
A selecção portuguesa desiludiu a meio campo. Foi-se desarticulando ao longo da partida. Faltou-lhe coesão, rapidez e eficácia na zona vital onde se constrói e destrói o futebol moderno. Faltou-lhe, em suma, uma «dobradiça de ouro» capaz de comandar a equipa a meio campo e pautar o jogo nessa zona vital. E a «dobradiça de ouro», como já lhe chamei quando ele jogava no FCP, chama-se Deco. É um extraordinário jogador de equipa: óptimo na recuperação de bolas e no apoio ao ataque; intuitivo, lúcido e eficaz nas marcações; tecnicamente excelente no drible, no passe e no remate. É o futebolista português mais completo da actualidade. Precisa é de estar bem fisicamente. O que não é nada fácil no final de uma época em que foi outra vez campeão de Espanha e campeão da Europa, com mais de 60 jogos nas pernas. «Oremos» pela recuperação de Deco!
Claro que uma «andorinha» não faz a Primavera e que um jogo só não basta para avaliar o potencial de uma equipa. Mas é certo que Portugal não fez melhor com Angola do que nos jogos particulares com Cabo Verde e Luxemburgo. E o que já se viu de bom neste campeonato (holandeses e checos, por exemplo) dá que pensar. Pode ser que a um maior grau de exigência dos próximos adversários corresponda um aumento do nível e da qualidade de jogo da nossa selecção. É nisso que todos apostamos. A ver vamos.
(*) Crónica de Alfredo Barroso no «DN» de hoje (não está online), aqui transcrita com sua autorização.

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1 Comments:

Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

Mail/Comentário à crónica de Pedro Rolo Duarte (e não a esta, de Alfredo Barroso)também publicada no «DN» de hoje


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(...)

Costumo ler sempre, e com prazer, as suas crónicas.

Quanto à de hoje, embora o futebol não me preocupe muito nem pouco, gostava de fazer um reparo quando defende que só no fim dos trabalhos feitos é que se pode/deve criticar.

Trata-se de uma argumentação muito frequente, mas vou-lhe dar dois exemplos (um, real, e outro sob a forma de uma velha anedota) que mostram que nem sempre será assim:

1º - Há anos, apanhei um táxi na rua Castilho e mandei-o seguir para uma rua de Benfica.
Para minha surpresa, o taxista deu meia-volta e tomou o sentido oposto.
Vim a saber que mal conhecia Lisboa, e que me ia levar para um sítio que nem eu sei qual seria!
A crer na sua crónica, só no fim da viagem é que eu poderia criticar o trabalho do homem...

2º - Um pintor está a pintar, numa parede: «ATENSSÃO AOS ÇALDOS».

Quando um passante faz o reparo que se impõe, o "artista" responde-lhe:

- O meu amigo pode saber muito de gramática, mas de pintura percebo eu. Além disso, primeiro, deixe secar a tinta, e depois fale!

14 de junho de 2006 às 10:24  

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