9.2.07

A POLÍTICA DO MEDO

A «CRUZADA ANTICOMUNISTA» e a «caça às bruxas» desencadeadas pelo senador Joe McCarthy no começo da Guerra Fria, entre 1950 e 1954, constituem um dos capítulos mais negros e vergonhosos, não só da história do Partido Republicano, mas da própria história da democracia nos EUA. Num excelente e documentado ensaio intitulado The Age of Anxiety - McCarthysm to Terrorism, o jornalista e historiador norte-americano Haynes Johnson recorda outro episódio negro da história dos EUA: a onda de histeria colectiva provocada pelo Grande Pânico Vermelho (Great Red Scare), nos anos que se seguiram à I Guerra Mundial. Mas o seu objectivo fundamental é analisar e descrever, em pormenor, o McCarthysmo, pondo em relevo os paralelismos e as semelhanças que devem estabelecer-se entre esse período negro da história dos EUA e o período actual, iniciado já no século XXI, após os atentados de 11 de Setembro de 2001. Como Haynes Johnson salienta, o McCarthysmo continua a ser uma história sem fim à vista.
Tal como na época do McCarthysmo, a América de George W. Bush tem vindo a experimentar novos exemplos de tácticas de manipulação e intimidação características do senador McCarthy. Desta vez, porém, a iniciativa foi do próprio Presidente. Desde os atentados de 11 de Setembro, sucederam-se os exemplos de assassínios de carácter, de ofensas ao bom nome dos opositores, de acusações de falta de patriotismo dirigidas aos críticos da administração, de pressões exercidas sobre os meios de comunicação social, o Congresso e o poder judicial, de fugas selectivas de informação classificada visando a demonização de dissidentes, destruindo carreiras de funcionários públicos e manchando a reputação de oficiais das Forças Armadas. Tudo isto, restringindo e violando direitos, liberdades e garantias, recorrendo a métodos inquisitoriais do tipo «caça às bruxas» para intimidar os que se atrevem a protestar publicamente contra o Governo e não hesitando em invocar o segredo de Estado para encobrir os erros e mentiras do Governo.
O McCarthysmo foi o resultado da conjugação de ansiedades, medos e suspeitas difundidos na população, para criar um clima de histeria e paranóia na vida pública e na retórica política. Esses medos e suspeitas foram explorados e exacerbados, com cinismo e demagogia, por políticos oportunistas e sem escrúpulos, como Joseph McCarthy, que nunca hesitou em recorrer à mentira, à difamação e às falsas acusações. Haynes Johnson salienta que o McCarthysmo marcou indelevelmente, nos últimos 50 anos, a caminhada do Partido Republicano para a direita radical. No McCarthysmo mergulham as raízes do actual movimento conservador. Foi nele que foram beber os antigos esquerdistas que se tornaram neoconservadores. A chamada «cultura de guerra» que contamina os discursos de muitos políticos e intelectuais nos EUA, é outra das heranças do McCarthysmo. Quer no plano interno, quer no plano externo, a política do medo tem sido desastrosa.
«DN-6ª» - 09 Fev 07
NOTA: Este texto encontra-se também afixado no blogue «TRAÇO GROSSO» [v. aqui], arquivo das crónicas publicadas pelo autor no «DN-6ª».

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